Vinte e quatro horas e quatro escalas depois, chego finalmente a San Pedro de Atacama. É de noite, tenho muita fome, sono e o corpo moído de tantas acelerações e desacelerações.
Saio do hostal em busca de comida. O condutor do transfer já me tinha sossegado: “Em San Pedro, para comer, basta ter fome.” A pequena aldeia, com 2500 habitantes locais e uma população móvel de mais do dobro, não fica atrás das mais cosmopolitas metrópoles. Lojas, restaurantes e agências de turismo estão abertas até à meia-noite, uma da manhã.
Assim que ponho o pé fora de casa e me lembro de olhar para cima, perco o cansaço, o sono e a fome (bem, a fome não). Estou por baixo do centro da nossa Galáxia e percebo finalmente porque lhe chamam Via Láctea. Parece mesmo um rio leitoso, onde apetece mergulhar. Também se percebe a nebulosa brilhante das Nuvens de Magalhães (que receberam o nome de Fernão de Magalhães, o primeiro europeu a observá-las, durante a sua viagem de circum-navegação) “O céu é o melhor que nós temos”, diz-me Ruby, a dona do Hostal Masai(em atacamenho significa ‘aquele que traz a chuva’). E os chilenos cuidam do seu céu como ninguém.
As ruas são iluminadas por candeeiros de ferro preto que só se acendem à passagem de pessoas e não emitem luz para cima. Uma medida que poupa energia e limita a poluição luminosa, principal inimiga de um céu estrelado. Com ruas de terra batida avermelhada, casas baixinhas de adobe e pedra, e uma praça principal a que não falta uma igreja e árvores generosas (onde o presidente do Chile, Sebastián Piñera, que estará presente na inauguração do Observatório ALMA, tinha sido visto a passear), San Pedro é simplesmente encantadora. Ouvem-se todas as línguas e percebem-se várias proveniências. Num restaurante, uma dúzia de alemães celebra a despedida de um colega de trabalho. São engenheiros do ALMA. O trabalho está feito. Faltam dois dias para a grande inauguração do maior observatório da atualidade.