Apesar da evolução registada ao longo dos últimos anos, o panorama da tecnologia ainda continua a ser marcado pela desigualdade de género – um fenómeno que assume múltiplas facetas e que se torna particularmente evidente quando olhamos, por exemplo, para a representação feminina em posições de liderança.
Dados da mais recente edição do Global Gender Gap Report, do Fórum Económico Mundial (WEF, na sigla em inglês), indicam que, entre 2023 e 2024, a percentagem de mulheres em cargos de liderança de topo na tecnologia registou uma ligeira diminuição de 26,7% para 26,4%. Em Portugal, dados apresentados este ano pela consultora Informa D&B indicam que as mulheres ocupam 30% dos cargos de gestão e 27% dos cargos de liderança. A percentagem é ainda mais baixa no setor das tecnologias de informação e comunicação, onde as mulheres em cargos de gestão representam 18%.
Mas não é só nos cargos de liderança onde a presença feminina continua a ser sub-representada. Como realça Madalena Costa, co-líder da comunidade Ladies That UX Lisboa, em entrevista à Exame Informática, “a representação em áreas mais técnicas continua limitada”.
“Não há dúvida que têm existido avanços na área da tecnologia. Contudo, as mulheres em UX [User Experience]continuam a enfrentar desafios significativos, como a disparidade salarial, a sub-representação em cargos de liderança ou algumas barreiras culturais e estereótipos, que limitam oportunidades e criam dificuldades adicionais, especialmente para mulheres de grupos minoritários”
Madalena Costa
Co-líder da Ladies That UX Lisboa
São várias as iniciativas que têm vindo a reunir esforços para reverter estas tendências nas múltiplas áreas que compõem o mundo da tecnologia. No campo da User Experience, a comunidade Ladies That UX, fundada em 2013 no Reino Unido por Lizzie Dyson e Georgie Bottomley, começou com pequenos encontros locais. Hoje conta já com mais de 90 capítulos um pouco por todo o mundo.
Segundo a responsável, empoderamento feminino, inclusão e colaboração afirmam-se como os três grandes pilares que guiam a comunidade, incentivando mulheres a “desafiar barreiras, assumir papéis de liderança e inovar na área de UX”, mas também a sentirem-se representadas e apoiadas independentemente das suas origens e a partilharem conhecimento e a apoiarem-se para crescerem em conjunto.
Em Portugal, a comunidade conta com dois, um em Lisboa, que nasceu em 2014, e outro no Porto, criado em 2022. O capítulo lisboeta, fundado por Isabel Novais Machado, surgiu “numa altura em que existiam poucas comunidades dedicadas às mulheres na tecnologia em Portugal”, explica. “Inspirado por capítulos internacionais, o movimento adaptou-se à realidade portuguesa, focando-se nas necessidades específicas das mulheres em UX, como a falta de representatividade e de espaços para partilha de histórias e desafios”.

Dos primeiros encontros mais informais, a comunidade em Lisboa foi crescendo ao longo dos últimos 10 anos, passando para “para uma rede estruturada, com eventos mensais e programas de apoio”. Entre as atividades desenvolvidas incluem-se, por exemplo, workshops de acessibilidade e design thinking para dar às mulheres a trabalhar na área de UX as ferramentas que precisam para criarem soluções mais inclusivas. Há ainda espaço para programas de mentoria concebidos para ligar quem tem mais experiência a quem está a dar os primeiros passos ou a quem quer avançar na sua carreira, além de colaborações internacionais com outros capítulos da comunidade e meetups semanais.
A colaboração com empresas em Portugal apresenta também um papel relevante para o crescimento da comunidade, afirma a responsável. Exemplo disso é a recente parceria com a FLAG para o eBook Design em Perspetiva – As Múltiplas Facetas do Design. Lançado em outubro, o eBook reúne um conjunto de reflexões acerca do papel do design na sociedade, contando com a participação de 14 profissionais da área.
Madalena Costa é uma das vozes que fazem parte deste conjunto, com um artigo que se centra “no design de produto como uma ferramenta essencial para transformar ideias em soluções de mercado bem-sucedidas, mesmo em ambientes de intensa competição e constante mudança”. Na visão da responsável, esta é uma colaboração que reflete também dois grandes compromissos do movimento: por um lado, “promover o design como um motor de inovação” e, por outro, “capacitar mulheres para liderarem no setor”.
Da organização de eventos a nível nacional à criação de conteúdos educativos e acessíveis, passando ainda por programas de mentoria e parcerias com empresas e organizações globais: para o capítulo lisboeta da Ladies That UX o futuro passa pela aposta em iniciativas que querem “não só apoiar as mulheres no seu percurso profissional, mas também inspirar mudanças no panorama da tecnologia e design em Portugal”. “Estamos entusiasmadas com o que está por vir e confiantes de que, todas juntas, podemos criar um futuro onde as mulheres em UX têm um papel central na definição do mercado e na inovação tecnológica”, realça.