Não há tema mais quente do que a Inteligência Artificial no mundo da tecnologia e o SAP Sapphire não escapou a esta tendência. A Exame Informática aproveitou a presença no evento, que decorreu em Barcelona, para realizar uma entrevista exclusiva a Philipp Herzig, Senior Vice President e Head of Cross Product Engineering & Experience da SAP, e, inevitavelmente, a IA foi o tópico dominante da conversa.
Exame Informática: O facto de o ChatGPT ter tornado a Inteligência Artificial algo mainstream despertou a vontade dos clientes em adotarem esta tecnologia?
Philipp Herzig: Julgo que com o ChatGPT e a IA generativa ou grandes modelos de linguagem atingimos um nível completamente novo em termos de avanços tecnológicos. Penso que o que o ChatGPT fez, em particular, foi alertar para o potencial do que a IA é capaz. Portanto, é o avanço tecnológico e a forma como é facilmente acessível para as pessoas, o que também mudou a perceção do quão poderosa é a IA.
A facilidade de utilização prendeu a atenção do utilizador…
Exato. E agora toda a gente está a falar sobre como é facilmente acessível e já não é algo abstrato. Com o aspeto generativo, vê-se fazer algo pelas pessoas – às vezes, não faz sentido, mas vê-se como a tecnologia é poderosa.
Da sua perspetiva, quais as grandes vantagens e as grandes ameaças desta tecnologia?
Primeiro, vejo grandes oportunidades. O que é novo é o aspeto generativo. No passado, com os algoritmos clássicos, tinham de se reconhecer padrões, classificar problemas – como a classificação de imagens, por exemplo –, ou fazer uma previsão matemática. Agora é possível gerar conteúdo novo. Na investigação, há 3 ou 4 anos, acreditava-se que estas coisas não seriam possíveis a curto prazo, mas agora vemo-las com o ChatGPT. Penso que cabe a nós desenhar para nosso benefício e usá-la de uma forma responsável. Por exemplo, num contexto de negócio, queremos saber como pode ajudar a aumentar a produtividade, enquanto mantemos os nossos elevados standards para obter uma IA confiável e ética, que é algo em que todos os nossos casos de uso assentam.
Essa vertente ética e a regulamentação da União Europeia pode, de certa forma, ser uma limitação ou atraso para a velocidade do desenvolvimento da IA quando comparado com EUA ou China, por exemplo?
Do meu ponto de vista, estamos nisto a longo prazo. Não chamaria um atraso, acho que é muito importante para as empresas olharem para a SAP e verem que oferecemos algo que cumpre requisitos e garante qualidade. Para nós, é muito claro que devemos olhar para estes aspetos, mesmo que leve 2, 3 meses ou mais para assegurar que é uma utilização produtiva, explicável e transparente. É também assim que lidamos com privacidade dos dados e informação identificável de pessoas, assegurando que o humano está sempre ciente. Falamos muito em automação, mas, no final, a decisão cabe sempre ao humano. Quer publicar uma vaga profissional proposta por IA generativa? A decisão estará com o humano. Queremos evitar vieses ou discriminação nestes casos, é algo que temos de fazer e, daqui em diante, será diferenciador se tivermos esses aspetos em conta e não apenas fazer coisas arbitrárias com ela.
O ano passado lançaram a Build, uma ferramenta de low-code. Vê a IA como algo que pode fomentar o low-code?
Sem dúvida. Temos já demonstrações e casos de estudo sobre isso. Dou um exemplo. Temos as nossas ferramentas de low-code/no-code, mas por baixo está um modelo de aplicações cloud que permite criar, de forma fácil, apps simples. Acho que a IA entra em ação para permitir começar ainda mais depressa. Quando estamos a conversar com clientes, torna-se uma cola entre a descrição dos requisitos e o que se quer que a aplicação faça, recorrendo depois às ferramentas de low-code/no-code para refinar os pormenores, porque a linguagem natural também tem as suas limitações. Chega-se a um ponto em que é difícil exprimir em linguagem natural o que se quer que uma ferramenta de código faça e seja eficaz.
A SAP tem uma espécie de posição única por ser parceira de praticamente todas as grandes tecnológicas. Como é que gerem estas parcerias na perspetiva do vosso próprio desenvolvimento de inovação? Por exemplo, integraram o Copilot da Microsoft nas vossas soluções, mas calculo que já estivessem a trabalhar numa solução similar…
Para clarificar, não estamos a embutir o Copilot diretamente, estamos a usar os serviços da OpenAI através da plataforma da Microsoft [Azure OpenAI Service API]. Temos como estratégia embutir a IA nas nossas aplicações de negócios para ajudar nas compras, finanças, recursos humanos… – em todas as funções que ajude na produtividade ou a tornar mais visíveis informações que estariam ocultas sob um grande volume de dados, etc. O que queremos fazer é usar a melhor tecnologia – de uma perspetiva de qualidade, de performance, de preço – para ajudar a melhores resultados nas nossas aplicações para negócio. Portanto, é chave para nós fazermos parcerias com várias empresas de tecnologia porque não há só um modelo ou tecnologia que sirva para todos os casos. Pense nisto como uma caixa de ferramentas em que pode escolher a ferramenta correta para cada situação. Se quiser fazer um pequeno buraco não precisa de uma grande ferramenta, basta uma mais pequena e barata.
Além da IA, que outras grandes tendências tecnológicas deverão causar um impacto significativo nos próximos anos?
Antevejo que os próximos 2 a 3 anos sejam muito dinâmicos no espaço da IA, veremos ainda muitas inovações e novos players a emergir. Estou muito entusiasmado! E é sempre complicado falar, nos dias de hoje, sobre o que virá. Do ponto de vista tecnológico, já se fala de IA desde, não sei, os anos 70 e agora atingiu todo um novo patamar. Portanto, acho que a IA continuará a ser a grande tendência. Mas, ainda assim, também olhamos para outros tópicos na área empresarial, como XR [Extended Reality, que abarca Realidade Virtual, Realidade Aumentada e Realidade Mista]. E um método ainda muito inexplorado é a forma como as empresas fazem pagamentos digitais, é algo em que estamos a trabalhar bastante.
Relacionado com blockchain?
Não necessariamente. O blockchain faz parte, mas, no geral, tem a ver como, no futuro, as empresas vão transacionar entre elas, em que muitos fornecedores e compradores interagem numa rede. Uma das nossas inovações está relacionada com a remoção de fricções neste processo para que as empresas possam partilhar entre elas não só dinheiro como dados referentes à pegada carbónica para fins de sustentabilidade. E outra grande tendência, claro, é a sustentabilidade e o trabalho feito em direção a ela.
A computação quântica será uma tendência ainda distante?
Estamos a explorar este tópico e já fizemos experiências nesse campo. Acredito que, num contexto SAP, conseguiremos fazer algo nos próximos 2 a 3 anos. Mas, muito importante, ainda não terá uma vantagem quântica.
Pode explicar melhor?
Vantagem quântica significa que correria num computador quântico, que é programado de forma completamente diferente. Irá correr nele, mas não será muito mais rápido. A vantagem quântica é usada para dizer que este é o ponto alcançado em que o algoritmo quântico está a ultrapassar a eficiência e desempenho de um computador tradicional ou de um processador gráfico. Isso ainda levará algum tempo. Mas estamos a explorar o tópico de otimização de software, por exemplo.