Está satisfeito com o seu curriculum vitae (CV)? Talvez depois de ler este artigo fique com uma ideia diferente daquelas que devem ser as prioridades de um currículo moderno e, acima de tudo, eficaz. Sabia que quando submete o seu currículo junto das maiores plataformas de recrutamento e dos maiores empregadores, os seus dados pessoais e vida profissional vão, muito provavelmente, ser analisados e destrinçados por um computador?
Como revela Gonçalo Vilhena, diretor da área de tecnologias de informação (CIO) da Randstad Portugal, uma das maiores organizações na área do recrutamento profissional, assim que os currículos são carregados para a plataforma da empresa, são aplicadas tecnologias de análise de sintaxe (parsing) ao documento. “Extraem todas as competências, a experiência, as competências pessoais [soft skills], os dados pessoais e isto em campos pré-preenchidos. Depois são ligadas a árvores de taxonomia”.
O que estas árvores de taxonomia permitem é categorizar as variantes de uma determinada área profissional – p.ex., engenharia informática, programador, programador de sistemas são nomes reconhecidos internamente pelo sistema e que permitem criar similaridades entre diferentes atributos. Isto é feito, segundo o executivo da Randstad, com recurso a tecnologias de Inteligência Artificial que fazem a categorização e indexação dos termos incluídos no currículo.
Por esta altura deve estar a perguntar ‘mas para que é preciso de saber isto?’. A resposta é simples: quanto melhor perceber como funcionam as tecnologias aplicadas à análise de currículos, melhor pode criar um currículo que é eficaz para passar no crivo destas máquinas. O que descrevemos até aqui é apenas a primeira etapa do que acontece do ‘lado de lá’, de quem faz o recrutamento.
Feita a extração da informação dos currículos dos candidatos e da estruturação dessa informação, os software tentam de seguida encontrar uma correspondência entre “o que está no CV e o que foi configurado na oferta [do empregador]”, explica Gonçalo Vilhena. “Ajuda a hierarquizar os candidatos”.
Ou seja, quanto mais o seu currículo corresponder exatamente àquilo que as empresas estão à procura, melhor ficará posicionado no ranking para aquela vaga específica. “As palavras-chave são essenciais. Entender os requisitos e as palavras-chave é essencial”, acrescenta o CIO da Randstad Portugal. E quanto menos praticar esta filosofia, mais perto está de se tornar em mais uma vítima do chamado “buraco negro” dos currículos. “Enviamos um CV para um buraco negro e ficamos à espera de ter sorte que alguém nos agarre”.
E isto é tão mais importante quantas mais pessoas estiverem a concorrer para aquela vaga. Segundo o porta-voz da empresa de recrutamento, há, em média, 50 mil novos candidatos por mês a usar a plataforma da Randstad. E candidatos não significa obrigatoriamente desempregados. “Há candidatos que se inscrevem só para estar alerta, é como estar à procura de casa”.
Apesar da ajuda que o processo de correspondência (matching) dá aos recrutadores, ainda está muito longe de poder ser totalmente automatizado. “[As tecnologias] Ainda não oferecem o nível suficiente de tranquilidade de que não será [uma escolha] enviesada. Há vários exemplos de enviesamento no mercado, que depois rapidamente se transformam em máquinas de discriminação. Esta complexidade ainda vai demorar algum tempo a apurar”.
No final, também é importante que perceba que nem só da melhor correspondência tecnológica se faz uma oportunidade de trabalho. “O que o CV nos dá é muito pouco. A parte humana [entrevista] dá um conjunto de características e histórias que são contadas que é difícil de captar no CV”.
E o recrutador humano também faz a diferença. Por mais perfeito que seja o ‘match’ de competências técnicas e experiência profissional feito pelas máquinas, é preciso analisar três outros grande parâmetros: perceber o potencial do candidato para o futuro; perceber se o candidato se enquadra na cultura da empresa; e, não menos importante, perceber se o candidato se enquadra com o seu futuro patrão. E isto não são informações indexáveis por um sistema informático, como explica Gonçalo Vilhena.
“Podemos estar na empresa certa com a função certa, mas se não existir boa relação com a chefia o desenvolvimento não vai ser ideal, nem para um lado nem para outro”.