Os pais devem ser sensibilizados para a forma como lidar com a vida online dos filhos antes ainda da primeira gravidez, brinca Cristiane Miranda, coorganizadora da Semana do Bem-Estar Digital que se comemora pela primeira vez. Em conjunto com Tito de Morais, promove a iniciativa Agarrados à Net, no âmbito da qual se pretende, durante esta semana, informar e educar para o tema do bem-estar digital de crianças, jovens e adultos, de uma forma que passa mais pelos conselhos e estratégias do que pela culpabilização dos pais ou pela promoção de perspetivas alarmistas.
Mesmo que o assunto seja sério. Cada vez mais sério. Obesidade, sedentarismo, problemas de visão, comprometimento do desenvolvimento cognitivo. Tudo isto são possíveis consequências do excesso de tempo de ecrã. “Há bebés que ainda nem conseguem segurar o aparelho com as mãos e já passam tempo ao telemóvel. E há bebés que chegam à creche com o telemóvel na mão e são as educadoras que têm de os retirar porque os pais não são capazes de o fazer”, conta Cristiane. “É preciso que os pais tomem consciência do impacto que isto pode ter nas crianças”, diz Tito de Morais, que como fundador do projeto Miúdos Seguros na Net leva praticamente duas décadas dedicado a estas temáticas. É muito comum, conta, depois de tomarem consciência, que se mostrem surpreendidos quanto ao impacto que o tempo de ecrã pode ter.
Um dos temas tratados durante as conferências que decorrem nos dias 3 e 4 de maio são os padrões negros, ou seja, aquelas funcionalidades embebidas nas aplicações para nos manter agarrados. São elas o scroll infinito ou a reprodução automática de vídeos em que está subjacente o mecanismo de recompensa intermitente, em que são fornecidos conteúdos da preferência alternados com outros menos valorizados. “É como ir alimentando um macaco a bananas, mas alternadas com outros frutos”, compara Tito de Morais.
Em Portugal, a aprovação do diploma legislativo relativo à partilha de imagens íntimas aconteceu sem qualquer debate público. Não queremos que aconteça o mesmo com a proposta da EU
Tito de morais
Dois aspetos tornam ainda mais necessária a discussão destes temas e a atualização da informação. A pandemia e o novo normal que nos deixou a todos ainda mais dependentes dos ecrãs. E a discussão em curso, ao nível da União Europeia, acerca do aliciamento online ou grooming. “Em Portugal, a aprovação do diploma legislativo relativo à partilha de imagens íntimas [o Parlamento aprovou na sexta-feira passada o aumento de penas para a divulgação ou partilha de ‘nudes’, fotos, vídeos e e-mails sem consentimento] aconteceu sem qualquer debate público. Não queremos que aconteça o mesmo com a proposta da EU [que deverá ser sujeita a votação em setembro]”, alerta Tito de Morais. Que se mostra, no entanto, satisfeito com o anunciado agravamento das penas para quem expuser, indevidamente, conteúdos íntimos.
Iniciar, desde cedo, o diálogo sobre o tema, participar na vida digital dos filhos, manter-se informado são alguns dos conselhos para os pais. Para todos nós, há estratégias simples e fáceis de pôr em prática que podem ajudar a pegar num livro antes de adormecer em vez de ficar agarrado ao feed – e lamentar no dia seguinte de manhã. São elas por um despertador para delimitar o tempo gasto nas redes; desligar as notificações; mudar o telemóvel para o modo preto e branco.
Na página do projeto há uma série de recursos disponíveis, adaptados a famílias, escolas ou organizações, além do programa detalhado da iniciativa.