Há uma época para as apanhar, uma técnica para as encontrar e um segredo, passado de pais para filhos, para as tirar de debaixo da terra. Os grandes apreciadores de túberas fazem dezenas de quilómetros só para se poderem ‘lambuzar’ num prato desta iguaria e há quem as congele para ir prolongando o prazer de as degustar ao longo de todo o ano. Graças a uma descoberta de um grupo de cientistas da Universidade de Évora será possível aumentar a produção deste fungo, tornando-o mais fácil de o cultivar.
Normalmente as túberas vivem agarradas às raízes de plantas anuais, crescendo debaixo de terra como se fossem uma extensão da própria planta, numa relação de simbiose. Ora esta ligação a espécies de vida curta – que completam todo o ciclo de vida ao longo de um ano – acaba por limitar bastante a sua produção porque com a morte da planta também se vão as túberas. Daí a relevância da técnica inventada pela equipa de Celeste Santos e Silva, professora do Departamento de Biologia daquela universidade, já submetida a pedido de patente europeia.
A primeira parte do trabalho passou por conseguir alimentar e fazer crescer as túberas em laboratório. Um processo moroso e que exigiu muita paciência. “Demorámos muito tempo a acertar com a combinação certa de alimento”, admite a professora. Além de afinarem o alimento, à base da substância gelatinosa extraída de algas ágar-ágar enriquecida com nutrientes, os investigadores foram modificando outras condições, como a temperatura ou a radiação. Ao fim de inúmeras combinações chegaram à fórmula que mais agrada aos fungos, a tal que será alvo de propriedade industrial. “Conseguimos melhorar as taxas de isolamento e aumentar a proliferação de Terfezia spp de forma confiável e reproduzível”, sublinha. De notar que o género Terfezia é tido como o mais diverso e rico em número de espécies, do grupo das “trufas-do-deserto”.
O passo seguinte passou por conseguir uma ligação feliz e duradoura entre estes fungos e uma planta com tempo de vida mais longo, ou perene. Depois de terem sido bem-sucedidos em laboratório, os investigadores pegaram nas suas plantas com fungos agarrados às raízes e instalaram-nas numa propriedade. Também com sucesso. “Pelo menos dez anos devem durar”, avança. O que já começou a atrair a atenção de produtores que querem ver as suas terras colonizadas por túberas – aliás, é no campo, que a Exame Informática foi apanhar a professora, num trabalho de prestação de serviços contratado à Universidade de Évora.
Além do interesse gastronómico, estes “cogumelos subterrâneos” que aparecem na primavera no Alentejo e também na Beira Litoral e na Beira Baixa, são um alimento com importantes propriedades nutracêuticas, ou seja, com efeitos na saúde, como anti-inflamatório e estimulante do sistema imunitário. Têm também aplicação na cosmética.
A disseminação de plantas inoculadas com a espécie Terfezia spp também “previne a desertificação e erosão do solo, reforça a integridade e a multifuncionalidade da paisagem e permite a recuperação de áreas ardidas e/ou com solos degradados’’.
O trabalho continuará com outras espécies de túberas, adaptáveis a solos de natureza diferente. Mas sempre tendo presente que todas as espécies cultivadas não serão estranhas ao nosso território.