2024, o ano da morte de Paul Auster. À luz de uma lanterna, por João Tordo

D.R.

2024, o ano da morte de Paul Auster. À luz de uma lanterna, por João Tordo

Com a morte de Auster, em 2024, desaparece também uma tradição literária que vinha definhando – porventura desde o falecimento de Philip Roth, em 2018 –, e que elegeu o storytelling como ofício fundador, ancorada em outros nomes, como Don DeLillo, Jonathan Franzen, Joyce Carol Oates, Richard Price ou a ultramoderna Elizabeth Strout. A sugestão narrativa de Auster – a exploração de um território ficcional sugerido pelo destino trágico-cómico de uma personagem (Quinn, Walter Rawley, Marco Stanley Fogg, Nashe de A Música do Acaso, o alter ego Peter Aaron e Benjamin Sachs em Leviathan, para nomear uns quantos, terminando com Archie Ferguson em 4 3 2 1) – foi o marco de um escritor que enfeitiçou os anos 1990, e cuja obra perdura, mas que, por vários motivos, não o glorifica. É estranho, para mim, pensar hoje em Auster ou sequer falar dele; os seus livros foram tão importantes para a minha imaginação de leitor e de escritor e, contudo, não conheço quase ninguém que não o tenha “ultrapassado”. Mais do que um autor, Auster foi uma fase na vida de um leitor – porventura irrepetível, porque o tempo é cruel. Os anos 1990 não regressam, e os leitores têm agora um desafio bem diferente – o de desenterrar Paul Auster do baú das coisas vagamente esquecidas e não deixar que as suas personagens e narrativas (por vezes forçadas, sim, muitas vezes clichés, mas sempre honestas e sedutoras) desapareçam para sempre. Auster foi o escritor mais influente na minha vida literária entre os 15 e os 24 anos. A certa altura, deixei de o ler, retomando com 4 3 2 1; mas nem este nem nenhum dos livros dos 2000 conseguiram o impacto de Palácio da Lua, A Música do Acaso, A Trilogia de Nova Iorque, Leviathan ou Mr. Vertigo. Auster foi um escritor único e incrivelmente original, e o que os críticos lhe apontavam era precisamente o que fazia dele um autor tão fascinante: ser ele próprio com toda a vulnerável coragem do ser humano; limitado, mas também muito generoso. Foi o último autor que me fez ler até às quatro da manhã, à luz de uma lanterna, em dia de escola, e estou-lhe eternamente grato por isso.

*João Tordo
Escritor. Em 2024 lançou o thriller Os Dias Contados

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