A Elon Musk basta uma frase para dizer o que quer dizer. Por vezes, quatro palavras são-lhe suficientes. Durante anos, o dono da rede social X (antigo Twitter) – plataforma que adquiriu, em outubro de 2022, por 44 mil milhões de dólares – insistia querer envolver-se “o menos possível” em política. Hoje, no entanto, tornou-se no principal influencer mundial dos movimentos radicais populistas, alinhado com líderes como Donald Trump nos Estados Unidos, Javier Milei na Argentina, Jair Bolsonaro no Brasil ou Giorgia Meloni em Itália. Musk tem mais de 193 milhões de seguidores, e cada uma das suas publicações parece querer questionar o funcionamento das democracias ocidentais, que acusa de terem sido atingidas por um “vírus woke”, como repete com insistência, lançando dúvidas sobre sistemas progressistas e multiculturais. O homem mais rico do mundo – com uma fortuna estimada em 232 mil milhões de dólares (segundo as listas da Bloomberg e Forbes de 2023) – provoca, diariamente, abalos sísmicos à escala global: ataca governos (quase todos de esquerda), tribunais, jornalistas e ativistas; sugere “planos de paz” para regiões em conflito, muitas vezes à revelia dos interesses de Washington (como aconteceu nos casos da Ucrânia e de Taiwan); e gosta de apontar o dedo às agendas das minorias raciais, sexuais e de género. Agarrado ao argumento da “liberdade de expressão”, reabriu a porta da rede social da qual é dono a contas extremistas que se encontravam suspensas ou banidas. Neste momento, conteúdos racistas, xenófobos, homofóbicos e transfóbicos circulam livres e velozes pelo X. Nas últimas duas semanas, os motins racistas no Reino Unido alertaram para o problema.
À VISÃO, o politólogo José Filipe Pinto considera que “é nítida” a ligação de Elon Musk “a uma deriva radical populista, próxima da extrema-direita norte-americana”. “Depois de se ter sentado à mesa com o poder democraticamente eleito, afastou-se, e está agora mais próximo dos movimentos contracorrente e antissistema. Sabemos que, hoje, essa linha de pensamento está também muito próxima da agenda republicana de Donald Trump”, sublinha. Especialista em Movimentos Extremistas e Populismo, José Filipe Pinto destaca que, apesar de tudo, Elon Musk mantém algumas “cautelas” quando escreve nas redes sociais. “Ele não aponta diretamente o caminho, preferindo deixar pontas soltas, apenas questionando ou sugerindo. Isso permite-lhe manipular os seus seguidores, dando-lhes a sensação de que são eles quem toma as decisões. É isto, na prática, o populismo”, refere. “Uma estratégia”, sublinha José Filipe Pinto, que permite ao influencer “dizer o que quer”, mas “nunca ser responsabilizado por ser o autor de discursos de ódio”, muito menos “pelo caos e pela violência que possam, eventualmente, surgir nas ruas, provocados pela extrema-direita, na sequência do que se diz online”. “A plataforma da qual ele é dono [a rede social X] garante-lhe isso, e de forma muito simples. Basta-lhe desbloquear contas de pessoas e de movimentos que ultrapassam os limites que ele não pode ultrapassar, que chegam mesmo a dar ordens diretas aos seus seguidores. Basicamente, Elon Musk utiliza outros para que ataquem, efetivamente, o sistema, que ele próprio considera o inimigo que tem de ser derrotado”, afirma.