“Alucinar” – ou, no termo original, “hallucinate” – foi eleita a palavra do ano para 2023 pelo Dicionário de Cambridge. Outrora confinado ao ramo da psicologia, o dicionário atribui-lhe um novo significado graças à emergência da inteligência artificial. Originalmente, o termo “alucinar” era definido pelo dicionário inglês como “Verbo. Achar que se vê, ouve, sente ou cheira algo que não existe, normalmente influenciado por doença ou consumo de drogas”. Agora, a palavra passa a estar também associada às informações falsas produzidas pelas novas ferramentas de inteligência artificial.
Ao significado tradicional de “alucinar” o dicionário de Cambridge acrescentou: “Quando uma inteligência artificial (um sistema computacional que tem algumas características semelhantes às do cérebro humano, como a capacidade de produzir linguagem de uma forma que pareça humana) alucina, ela produz informação falsa”. Apesar de úteis, os geradores de texto de inteligência artificial são também conhecidos por dar aos seus utilizadores informações pouco credíveis, ou até mesmo, falsas. É a esse fenómeno que, agora, também se pode chamar de “alucinação”, e que ocorre quando as ferramentas dão informações erradas que podem variar entre pequenas sugestões a informações completamente absurdas.
Desde aplicações na medicina, engenharia ou educação, os novos sistemas de produção de inteligência têm duplicado no último ano e despertado o interesse do público pela abundância de tarefas e aplicações que podem ter em diversas áreas. Segundo o dicionário de Cambridge, o crescimento destas tecnologias – como o conhecido ChatGPT, Bard, DALL-E e BingAI – significa também a criação de nova terminologia – ou adaptação da existente – de forma a abranger os novos fenómenos digitais. “‘Alucinar’ é um verbo evocativo que implica que um agente experimente uma desconexão da realidade. Esta escolha linguística reflete uma mudança subtil, mas profunda na perceção: é a Inteligência Artificial, e não o utilizador, que está a ‘alucinar'”, esclareceu Henry Shevlin, um especialista em IA da Universidade de Cambridge.
Wendalyn Nichols, diretora de publicação do Cambridge Dictionary, acredita que o facto de estas ferramentas poderem dar ao utilizador informações falsas – ou “alucinar” segundo a nova definição da palavra – deve incentivar o público a recorrer às suas capacidades de pensamento crítico ao utilizar estas ferramentas. “As IA são fantásticas a processar grandes quantidades de dados para extrair informações específicas e consolidá-las. Mas quanto mais originais lhes pedirmos que sejam, mais provável é que se extraviem. A perícia humana é, sem dúvida, mais importante – e procurada – do que nunca, para criar a informação fidedigna e atualizada sobre a qual os LLM [grandes modelos linguísticos] podem ser treinados “, explica Nichols.
Todos os anos o dicionário de Cambridge elege uma palavra do ano. Nos últimos anos, foram eleitas palavras como “homer” – um termo associado ao basebol, eleito em 2022 –, “perseverança” (2021), “quarentena” (2020) ou “nomofobia” – o medo de ficar sem o telemóvel, em 2018.