A instagrammer partilhou, num conjunto de stories no seu perfil de Instagram, o seu método para resolver os episódios de choro da sua filha de três anos, relatando que, no último mês, a criança teve frequentemente pesadelos noturnos em que gritava e chorava e, quando acordava, pedia para ir para a cama da mãe. Contudo, Joana Mascarenhas afirmou que não cedia aos desejos da criança.
“Pensei que estava a criar uma rainha”, começou por dizer, acrescentando que, dada a frequência dos episódios, passou a desconfiar de que a filha já não tinha pesadelos e “só acordava a fazer birra”. Para a instagrammer, o “super remédio santo”, como descreve, passou por mergulhar a filha em água fria até ao pescoço, primeiro na piscina e posteiormente na banheira.
Contudo, para a psicóloga infantil Nathalie Marques este comportamento é “grave” e sujeita a criança a “situações que refletem o desequilíbrio emocional dos adultos.” Da mesma forma, Carolina Viana, psicóloga clínica, explica à VISÃO que os pais não têm de “saber gerir tudo o que acontece com os filhos e, por isso, às vezes vale a pena pedir ajuda profissional”.
“Uma birra é uma expressão natural da criança”, acrescenta ainda Nathalie Marques, que refere que é através deste comportamento que ela manifesta “uma necessidade física ou psicológica” que deve ser atendida. A especialista garante também que não existe uma fórmula exata para lidar com uma birra, mas que cabe ao adulto “a missão de ajudar a regular a sua expressão física e emocional, com uma postura tolerante”.
A forma de lidar com uma birra depende do perfil da criança e da intensidade da situação, já que “algumas crianças reagem bem ao abraço” enquanto que, para outras, é necessário estar apenas sentado ao seu lado e mostrar que se está ali, “até se conseguirem acalmar”, afirma a especialista.
A menina deverá sentir medo, desamparo, competição por parte de quem deveria dar-lhe segurança (emocional e física), humilhação e desvalorização das suas necessidades.”
Nathalie marques, psicóloga
No vídeo, que provocou uma onda de indignação e foi partilhado amplamente nas redes sociais – apesar de Joana Mascarenhas ter eliminado a sua conta de Instagram -, a jovem mãe relata o primeiro episódio em usou a àgua fria para parar uma birra da filha: “Eu não disse nada. Peguei nela, submergi-a na piscina até aqui [ilustra no vídeo o nível do pescoço], aquilo desconcentrou-a. O cérebro foi para outra coisa, estava com frio. Ao tirar o foco da birra, que ela estava a tentar ganhar (…) percebeu ‘caramba, se calhar a partir de agora, vou perder sempre’. Ela não faz uma birra na piscina há mais de dez semanas”, afirmou
Nathalie Marques afirma que, nesta situação, “o que se está a estabalecer é uma relação baseada em autoritarismo, em que o adulto obtém o que pretende através da punição, tendo como base de relação o medo”. A psicóloga acrescenta também que, neste momento, a criança de três anos “requer a atenção de um especialista, que lhe devolva a sensação de cuidado e de respeito”.
Quanto ao estado emocional da criança, a especialista prevê, baseando-se nos comentários da mãe, que “o estado predominante será ansiedade”, já que “se trata de uma estratégia (inadequada) para lidar com uma situação de crise” e, portanto, “a menina deverá sentir medo, desamparo, competição por parte de quem deveria dar-lhe segurança (emocional e física), humilhação e desvalorização das suas necessidades.”
“A relação entre pais e filhos é uma aprendizagem que deve ser conjunta, consoante as características individuais de cada um. Às vezes mais fácil, outras vezes mais difícil, mas nunca em competição”
carolina viana, psicóloga
Também nos vídeos Joana Mascarenhas descreveu um episódio em que a criança acordou a chorar durante a noite e a mãe repetiu o mesmo comportamento: “Peguei nela, de pijama, fui para dentro da banheira, molhei-a toda com água fria. Foi um super remédio santo. Ela levou com o banho de água fria, tirámos-lhe a roupa, ficou só de fralda, embrulhei-a na toalha, deitou-se na cama e dormiu três horas… Maravilhoso”. A mãe prosseguiu, afirmando que “ninguém tem de levar com os gritos de uma criança que está só a medir pilinhas”. “Quem ganhou?”, perguntou ainda.
“Não há ganhar ou perder”, garante Carolina Viana. “A relação entre pais e filhos é uma aprendizagem que deve ser conjunta, consoante as características individuais de cada um. Às vezes mais fácil, outras vezes mais difícil, mas nunca em competição”, afirma.
Também Nathalie Marques refere que entre pais e filhos “não há competição, porque não há equidade, o adulto já está em vantagem”, acrescentando que, para a criança, podem “emergir sentimentos que a tornem “retraída” e que façam com que “viva a sua dor em silêncio ou a leve ao extremo oposto de expressar a sua frustração, zanga, revolta para com os pares, outros adultos, ou para consigo mesma”, explica.
“Todos nós erramos. A questão é: podemos instituir uma política de medo, em que a criança só tem certos comportamentos pelo receio da punição ou queremos que eles aprendam a regular o comportamento e as emoções de forma equilibrada?”, interroga ainda Carolina Viana.
Depois da partilha dos vídeos, o Ministério Público (MP) decidiu abrir um inquérito à mãe da criança e, segundo avançou o Expresso, a investigação decorre agora na Secção Especializada Integrada de Violência Doméstica de Lisboa.
