Desde os dois anos que Vítor Fonseca sabe o que é ter falta de ar.
Quem o vir hoje, aos 44, um verdadeiro atleta, a pedalar na sua bicicleta aerodinâmica ou a correr veloz na estrada do Guincho, indiferente ao vento, pode duvidar da história que se vai contar.
Recuemos então ao início da vida de Vítor Fonseca. Nessa altura, perante a primeira crise de falta de ar, foi levado ao colo pelos pais, em aflição, para o hospital Dona Estefânia, em Lisboa, sem que eles percebessem bem o que se passava, pois não havia historial de asma na família.
Estima-se que 10% da população portuguesa tenha asma ao longo da vida e que 6,4% a mantenha ativa. A percentagem em Portugal está de acordo com a mundial, que ronda também os 10 por cento.
Rapidamente, a família Fonseca passou a tratar por tu esta doença inflamatória crónica da via aérea que pode ser multifatorial, pois na equação entram as componentes genética, alérgica ou ambiental. Por exemplo, Vítor, um dos cerca de 700 mil atingidos em Portugal, acredita que se tornou asmático por ter nascido no Barreiro, que nos anos 1980 era uma região com muita indústria poluente.
A rotina de Vítor Fonseca passou a oscilar entre crises mais ou menos graves, que o faziam acordar completamente bloqueado, sem conseguir respirar, pieira frequente, que ia debelando à custa da medicação adequada, como broncodilatadores e corticoides. Também fazia vacinação regular para as alergias, já que a sua condição piorava sempre na primavera e no outono.
Por volta dos 8 anos, a coisa acalmou. Mas até aos 16 a doença continuou a assombrá-lo. “É natural que na mudança de idade, a asma fique mais ligeira.” No entanto, adverte o agora médico pneumologista, “é preciso não esquecer que se trata de uma condição crónica, que pode ser muito bem controlada, mas para a qual não há cura.”
Aos seis anos, os pais inscreveram-no numa classe de ginástica, pois não havia uma piscina ao pé da casa, que era para onde se mandavam os asmáticos na época. Ao mesmo tempo integrou uma banda filarmónica para, através dos instrumentos de sopro, expandir a caixa torácica.
No final da adolescência, com a ida para a faculdade para estudar medicina, deixou de se exercitar e também largou a música. Curiosamente, ou não, acabou por optar por pneumologia e hoje muitos dos seus doentes, no hospital de Cascais e na privada, sofrem do mesmo mal. A eles, conta-lhes a sua história para desconstruir os mitos com que chegam à consulta (ver caixa).
Um homem de ferro
Só regressou aos treinos pelos 30, para aderir à moda das BTT. Depois, seguiu pelo ciclismo de estrada e mais tarde despertou para o triatlo e para as corridas IronMan. “Na altura, não corria nem nadava, por isso tive de arranjar professores para me ensinarem”, lembra, junto ao mar agitado do Guincho, completamente inadequada à natação em mar aberto.
Foi tão bem ensinado que aos 39 fez a primeira prova Iron Man. Entusiasmado, decidiu que antes dos 40, correria a sua primeira maratona. Agora, viaja sempre embalado pelas competições em que gosta de participar – a próxima será em julho e já está em preparação para ela.
Asma? Sim, nunca passa, mas dissimula-se muito bem nesta vida ativa, que o obriga a treinar quase todos os dias, em média 10 horas semanais, consoante a disponibilidade profissional e pessoal.
A medicação está agora guardada para as poucas ocasiões em que precisa dela. Antes das provas, “nem que seja pelo fator psicológico”, e em situações de maior ansiedade ou stress profissional. “A parte emocional é um grande desencadeador da parte respiratória”, explica o médico.
“O exercício físico é um bom tratamento não farmacológico. Melhora a capacidade e musculatura pulmonar, ajuda no controlo da inflamação, permite recuperar áreas do pulmão que estão esquecidas e não são utilizadas e habitua a via aérea ao ambiente”, resume o especialista e atleta. Além disso, reduz a medicação, os sintomas, as idas ao médico e permite uma vida muito mais saudável do ponto de vista respiratório, cardiovascular e até mental. “É um ótimo ansiolítico e antidepressivo.”
Boas notícias: não é preciso fazer provas de IronMan ou correr maratonas para obter estes efeitos benéficos, basta uma caminhada mais prolongada ou um passeio de bicicleta ao fim de semana para pôr os pulmões a mexer.
O que se diz por aí
Há muitos mitos à volta desta doença respiratória. Conheça aquela meia dúzia que não tem base científica de sustentação:
- O asmático não pode correr nem fazer exercício.
- A asma passa com a idade.
- As grávidas têm de interromper o tratamento para a doença.
- Os corticoides inalados engordam.
- A bomba faz mal ao coração e cria habituação.
- Trata-se de uma doença pediátrica.