Ao contrário da Polícia Judiciária, o Ministério Público (MP) não descarta totalmente a hipótese de o duplo homicídio, ocorrido na passada terça-feira, no Centro Ismaili de Lisboa, ter tido uma motivação terrorista.
Em comunicado, o diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Francisco Narciso, fez questão de salientar que a investigação “prossegue” para, por um lado, “o apuramento do factos” e, por outro, “a respetiva qualificação” dos crimes cometidos, não fechando a porta a nenhuma hipótese que possa estar na base dos homicídios das duas jovens portuguesas, Mariana Jadaugy, de 24 anos, e Farana Sadrudin, de 49.
No mesmo texto, disponibilizado no site da Procuradoria-geral da República, durante a noite de quinta-feira, 30 de março, Francisco Narciso adiantou ainda que Abdul Bashir, o autor do ataque, ficou sujeito a prisão preventiva, sendo que esta medida de coação “está suspensa enquanto durar o período de internamento” – o refugiado afegão, de 28 anos, continua internado no Hospital Curry Cabral, devendo receber alta dentro de, aproximadamente, duas semanas.
Segundo informações recolhidas pela VISÃO, no pedido feito ao juiz, o MP fez saber que estavam em causa fortes indícios da prática de dois crimes de homicídio, considerando que a hipótese de terrorismo poderia ter sido uma das motivações do atacante. Este mesmo argumento terá também sido utilizado no pedido a um juiz de instrução para a realização de buscas domiciliárias, as quais só não se concretizaram no dia do ataque, porque, segundo a CNN Portugal, uma juíza de instrução do Tribunal Central de Instrução Criminal terá recusado assinar os mandados fora do horário normal de expediente.
MP indica que o terrorismo pode ter sido uma das motivações para os dois homicídios cometidos por Abdul Rashid
Recorde-se que, na manhã de terça-feira, 28, Abdul Bashir deslocou-se, como habitualmente, ao Centro Ismaili de Lisboa, para mais uma aula do curso de português que frequentava, com outros 15 colegas, agendada para as 10h00. Cerca de 40 minutos depois, e sem aviso prévio, o homem atacou, com uma faca de grandes dimensões que trouxera de casa, o professor, perante os apelos dos colegas para que parasse.
Depois de fugir da sala, largando a primeira vítima, cruzar-se-ia, num corredor do Centro, com Mariana Jadaugy e Farana Sadrudin, que, atraídas pelos ruídos da confusão, se tinham aproximado para perceber o que se estava a passar. As duas mulheres – que trabalhavam, há pouco mais de uma ano, na Fundação FOCUS – Assistência, prestando apoio a refugiados da comunidade ismaelita a residirem em Portugal –, acabaria por ser esfaqueadas Abdul Rashi, morrendo ainda no local.
O ataque seria travado por dois agentes da PSP, que estariam a fazer um gratificado na Loja do Cidadão, nas Laranjeiras, a poucos metros do Centro Ismaili de Lisboa. A pronta intervenção destes agentes – que, depois de ouvirem os alertas pelo rádio, chegaram ao local em apenas um minuto – permitiu cessar o ataque. O refugiado afegão não obedeceu à ordem para largar a arma branca, sendo atingido a tiro numa perna, permitindo às autoridades travar e deter o suspeito.
Autoridades tentam perceber tudo
Segundo as primeiras informações, Rashid Abdul vivia em Odivelas, desde final de 2021, sozinho, com os três filhos menores de quatro, sete e nove anos, depois de ficar viúvo, após a sua mulher ter morrido num incêndio, num campo de refugiados em Lesbos, na Grécia, onde a família permaneceu quando chegou à Europa.
Abdul Rashid era “beneficiário de estatuto de proteção” – como confirmou o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro –, mas atravessa um quadro de depressão, sentindo-se “infeliz” no País, desejando partir para se fixar na Alemanha, como confirmou, à VISÃO, um compatriota deste homem radicado há vários anos em Portugal.
As investigações prosseguem, com vários factos por esclarecer. Nomeadamente, a razão por que Abdul Rashid tinha um bilhete de avião comprado para viajar para Zurique, na Suíça, agendado para o dia seguinte ao ataque.