Não deve haver um filme com (ou sobre) dinossauros que, a dada altura, não inclua o rugido potente e assustador de um Tiranossauro Rex, mas parece cada vez mais improvável que fosse essa a forma de vocalização da espécie.
Certezas não há, uma vez que, como é evidente, o som não fossiliza e não está cá ninguém para contar uma história que terminou há 66 milhões de anos. Mas os investigadores suspeitam de um som semelhante ao de uma buzina de nevoeiro, que parece que ressoa no nosso corpo. Ouve-se sim, mas, sente-se, sem dúvida.
Com a ajuda de técnicas de análise avançadas, os cientistas estão a mergulhar em fósseis raros recentemente encontrados para tentar montar este puzzle. Uma peça-chave foi descoberta em 1995 por paleontologistas do Museu do Novo México de História Natural e Ciência: um crânio inteiro de um Parasaurolophus, um herbívoro que tanto conseguia deslocar-se usando as quatro patas como apenas as duas traseiras. Imagens obtidas através de tomografia computorizada permitiram aos investigadores observar, com mais detalhe que nunca, a crista deste animal e reconstruir digitalmente este órgão, simulando a ressonância do ar a passar por ela, com ou sem órgãos vocais, como a laringe ou equivalente. Mesmo sem este “aparelho”, concluíram, o Parasaurolophus poderá ter emitido um som graças ao ressoar do ar expelido dentro da crista.
“Eu descreveria o som como ‘de outro mundo'”, diz Tom Williamson, um dos paleontologistas envolvidos na escavação e agora curador da área no museu. Para tentar uma analogia com um som produzido por um animal ainda vivo, o especialista recorre aos casuares, uma ave australiana que não voa e emite uma série de sons de reverberam na selva onde habitam.
Julia Clarke é uma paleontologista da Universidade do Texas que, em meados da década passada, se dedicou a examinar o fóssil de uma ave que terá convivido com os dinossauros no período Cretácio e descobriu uma siringe, um órgão presente nas aves, responsável pela produção e emissão de sons. Para Clarke, o facto de este órgão fossilizar levantou uma questão: porque nunca foi encontrado nenhum de dinossauro? Esta dúvida levou a cientista a aprofundar a investigação e a chegar à conclusão que contraria tudo o que pensamos sobre a vocalização dos dinossauros: é quase certo que não rugiam. Provavelmente arrulhavam como os pombos.
“Os filmes do Parque Jurássico perceberam mal”, ri-se Clarke, que acredita que muitos dinossauros podem ter produzido sons com a boca fechada.
A anatomia do ouvido destes animais constitui outra pista neste sentido e, aqui, há registos fósseis a suportar a teoria. Phill Manning, professor de história natural da Universidade de Manchester, explica que os dinossauros só tinham um osso no ouvido médio, o estribo – uma estrutura fundamental na tradução das ondas sonoras para o ouvido interno, de forma a poderem depois ser processadas pelo cérebro -, enquanto os mamíferos, além do estribuo, ainda têm o martelo e a bigorna (os nomes devem-se à semelhança com estes objetos, como é fácil de imaginar).
Sem estes dois últimos, os dinossauros, provavelmente, só conseguiam ouvir uma gama de frequências muito mais reduzida, quando em comparação com os mamíferos.
“O estribo dos dinossauros era bastante grande, quase do tamanho de um fósforo no T-Rex, o que significa que estava bem sintonizado com frequências mais baixas”, continua Manning, citado pela BBC. Por outro lado, a dimensão dos ductos cocleares do ouvido interno sugere que, no geral, a espécie era capaz de captar os sons de alta frequência.
O alongamento coclear, que denota sensibilidade a barulhos estridentes, ocorreu perto da origem do grupo que incluiu aves e crocodilos e Bhart-Anjan Bhullar, curador associado de paleontologia dos vertebrados do Museu Peabody de História Natural, da Universidade de Yale, adianta que, depois de várias reconstruções e estudos, a única explicação consistente com tudo o que se sabe prende-se com a passagem a um nível mais elevado de cuidados parentais. Esta sensibilidade a sons mais estridentes seria, então, usada para localizar as crias.
Podendo animais de tão grande porte produzir uma tão grande variedade de sons, fica a questão: como soariam aos ouvidos humanos? Muitos, acreditam alguns investigadores, seriam inaudíveis para nós. Os sons de baixa frequência e infrassons são particularmente úteis para viajar longas distâncias, tanto em espaços abertos como em habitats densos, como a selva, mas tão baixos que dificilmente os captaríamos. E, certamente, não soariam a “roarrrrrrrr”…