As últimas imagens enviadas pelo Telescópio Espacial James Webb, lançado a 25 de dezembro de 2021 pela NASA, prometem ser um marco científico. O sucessor do telescópio Hubble partiu para o espaço com a missão de “ir além”, como explica o próprio site oficial do Webb, explorando os astros mais distantes através da luz infravermelha que emitem.
O Webb especializa-se concretamente em captar luz infravermelha, invisível ao olho humano. Antes dele, o telescópio Hubble, lançado em abril de 1990, foi criado para a captação de luz visível e as imagens que recolheu provaram-se decisivas para o atual conhecimento que detemos do universo, algo que se espera que o Webb também faça.
Embora capte alguma radiação infravermelha, as capacidades do Hubble não permitem explorar os astros mais distantes, que representam também os mais antigos. Como explica a NASA, “por causa do tempo que a luz leva a viajar, quanto mais distante um objeto estiver, mais atrás no tempo estamos a recuar”, o que significa que quanto mais longe está um dado astro, mais antigo este é e mais rica é a sua história, importante para uma melhor compreensão do começo do universo.
A radiação infravermelha, captada pelo Webb através de um sistema composto por 18 espelhos hexagonais revestidos em ouro e com um total de seis metros e meio de altura, dá uma visão mais ampla de todos os astros escondidos ao olhar humano. Isto porque não só permite ver os objetos mais distantes, visíveis apenas através do infravermelho, mas também porque levanta o véu sobre algumas estrelas e planetas em formação que, normalmente, surgem escondidas entre “casulos de poeira que absorvem a luz visível” e que impedem estes astros de serem percetíveis ao olhar humano, como explica a NASA.

Criado com o objetivo de explorar a luz invisível do universo, o telescópio Webb irá permitir conhecer uma realidade mais distante do cosmos e até recuar no tempo para perceber o seu começo. Tal só é possível porque, com a distância, a luz vai transitando gradualmente no espetro eletromagnético passando de visível para infravermelha, ou seja, invisível, razão pela qual os astros mais distantes não são visíveis.
As primeiras imagens lançadas pelo Webb em fevereiro estavam, contrariamente às recentemente divulgadas, desfocadas. A nitidez da foto está diretamente dependente do alinhamento dos espelhos, que deve ser feito em escala nanométrica, cuja unidade de medida, o nanómetro, é cerca de mil milhões de vezes mais pequeno do que o metro. Uma medida tão reduzida pode facilmente sofrer desajustes, o que se traduz numa imagem de má qualidade. As imagens divulgadas este mês seguiram o realinhamento do espelho principal, um processo crucial na obtenção de imagens nítidas, e que marcou a diferença entre o primeiro e o segundo conjunto de imagens lançado pelo telescópio.
Ainda assim, e apesar de a imagem já ter surpreendido os cientistas, o processo de alinhamento não está completo. O resultado final foi, por isso, um indicador muito positivo das capacidades do telescópio. “As imagens de engenharia que vimos hoje são tão nítidas e focadas como as imagens que o Hubble tira, mas estão num comprimento de onda de luz que é totalmente invisível para o Hubble. Isto está a permitir ver o universo invisível num foco muito nítido”, explica a cientista do projeto de operações Webb, Jane Rigby no Goddard Space Flight Center da NASA em Maryland num comunicado de imprensa coletivo.
Focar o desfocado e ver além
As imagens divulgadas em fevereiro mostram a estrela HD84406. Uma vez que o processo de alinhamento estava ainda numa fase inicial e cada espelho funcionava não como um todo unido, mas individualmente, a imagem final surgiu desfocada. Em contrapartida, as imagens divulgadas este mês estão de tal modo focadas que mostram não só a estrela 2MASS J17554042+6551277, o núcleo de luz central na foto e o principal alvo da imagem, como um conjunto de manchas e pontos em seu redor que representam várias galáxias distantes.
Tudo aquilo que não vemos e que se esconde além do olhar é agora captado pelo Webb. Galáxias de outra forma invisíveis surgem representadas na imagem captada pelo novo telescópio da NASA, provando a sua capacidade de captar o conhecido como campo profundo. O seu antecessor, Hubbe, já havia sido construído também nesse sentido, no entanto o Webb vem superá-lo sendo capaz de alcançar uma realidade ainda mais distante.
“Não há forma do Webb olhar durante 2 segundos para qualquer ponto do céu e não obter um campo incrivelmente profundo”, disse Rigby. “Este vai ser o futuro a partir de agora. Para onde quer que olhemos, é um campo profundo. Sem qualquer esforço, estamos a recuar no tempo até galáxias cuja luz que vemos é semelhante à de milhões de anos atrás.”
O Webb vem inovar a tecnologia espacial até então conhecida. De acordo com o testemunho do cientista do projeto Webb da NASA para a integração, teste e comissionamento, Randy Kimble, à Space, o Webb tem a capacidade de captar imagens de campo profundo de alta qualidade em apenas algumas horas, enquanto que o Hubble requer semanas para obter os mesmos resultados.
O telescópio Webb foi projetado para ser até 100 vezes mais sensível que o Hubble, um objetivo que que a equipa do projeto não só considera que tenha sido alcançado como até superado. “Dissemos no outono passado que saberíamos que o telescópio estava a funcionar corretamente quando tivéssemos uma imagem de uma estrela que se parecesse com uma estrela”, disse Lee Feinberg, gerente de elementos do telescópio ótico Webb no Goddard Space Flight Center da NASA, em comunicado. “Agora estamos a ver essa imagem. Estou satisfeito em dizer que o desempenho ótico do telescópio é absolutamente fenomenal, está realmente a funcionar extremamente bem. O desempenho é tão bom, se não melhor, do que a nossa previsão mais otimista”, acrescentou.
Tecnologia inovadora
Posicionado a cerca de 1,5 milhões de quilómetros da Terra, o telescópio Webb veio trazer muitas novidades ao mundo da astronomia e, além de ter sido o autor da imagem mais nítida de luz infravermelha alguma vez tirada no espaço, destaca-se também pela sua estrutura inovadora.
De facto, o mais recente telescópio da NASA é o primeiro a ser capaz de se dobrar, uma tecnologia nova que nunca havia sido aplicada em nenhum outro telescópio espacial e que foi determinante no sucesso da sua missão. Por incluir tecnologia que até então não tinha sido desenvolvida, o projeto do Telescópio Espacial James Webb ultrapassou orçamentos e foi vítima de muitos atrasos, segundo a Space. Ainda assim, e apesar dos muitos obstáculos, os esforços parecem ter valido a pena. Para Thomas Zurbuchen, administrador associado da NASA para a ciência, o conhecimento do universo continua a ser uma “montanha para escalar”, mas as imagens obtidas recentemente pelo Webb trazem boas notícias e vêm provar que essa montanha já está a ser escalada, como explica em comunicado.
As próximas imagens têm data marcada para junho ou julho deste ano. Até lá ainda há trabalho a fazer: o alinhamento dos espelhos tem de ser concluído e a equipa deve assegurar que todos os instrumentos que constituem o telescópio mantêm temperaturas reduzidas, algo igualmente importante na captação de uma imagem nítida nomeadamente porque, tratando-se o Webb de um telescópio que capta luz infravermelha (luz essa que é essencialmente calor), qualquer outra fonte de calor, mesmo se proveniente do próprio telescópio, ofuscaria os seus detetores impossibilitando que captassem os objetos mais distantes do universo, ou o campo profundo.
Uma vez alinhado e arrefecido, o telescópio Webb está pronto para explorar o universo e descobrir mais sobre o infinito que se esconde ao nosso olhar. O seu próximo objeto de análise não é ainda conhecido pelo público, mas, com certeza, será mais uma peça para o puzzle dos cosmos que estamos apenas agora a começar a desvendar.