As notificações surgem de todo o lado: de emails de trabalho, de notícias de última hora, dos descontos da nossa loja preferida ou das redes sociais, seja no telemóvel, no computador, no tablet ou até no relógio. Umas são mais urgentes que outras, mas todas elas têm a mesma função: alertar que existe uma nova interação que é do nosso interesse, por isso, exigem uma ação, mesmo que seja descartá-la. E são estes segundos que nos levam a perder a concentração e a capacidade de voltar a focar no que estávamos a fazer.
Sophie Leroy, professora na Universidade de Washington Bothell, é especialista em interrupções no trabalho, embora muitos dos seus estudos também se apliquem à vida pessoal. A também investigadora classifica as notificações em duas categorias: “Notificações de resposta imediata”, como os emails de trabalho, e as notificações que não exigem uma mudança de atenção, como as notícias ou promoções.
Qualquer um dos tipos de notificações é desafiador e complexo de descartar. Por exemplo, ser surpreendido com uma notificação de uma sms de um amigo, que não é urgente, pode chegar a ser desgastante: “A pessoa pensa: ‘Ok, o que é que o meu amigo quer?’ Existe incerteza quando não visualizamos logo e não lidamos bem com a incerteza”, explica a especialista. Ignorar a notificação, garante, é “cognitivamente difícil”.
Para este tipo de interações é necessário um certo autocontrolo e quando as notificações são uma constante, ao longo do dia, o nosso cérebro começa a ficar exausto. “Quando usamos o recurso do autocontrole, este esgota-se com o tempo, e aí será mais difícil ignorar essas notificações”, afirma Sophie Leroy.
O processo parece ser simples: verificar a notificação, rapidamente, descartá-la e voltar ao trabalho. Mas o trabalho mental é muito significativo: “À medida que o cérebro faz a transição entre contextos”, diz a professora, “a nossa linha de pensamento foi interrompida. E quando voltamos ao trabalho que estávamos fazer, o cérebro tem dificuldade em lembrar exatamente onde estávamos. Recuperar o ritmo e atingir o mesmo nível de concentração leva tempo”.
Para comprovar isto, Sophie pediu a um conjunto de pessoas que realizassem tarefas complicadas nas quais tinham de se concentrar – analisar currículos para encontrar o candidato mais adequado para um determinado cargo. As pessoas que são interrompidas, conclui, “têm 17% menos probabilidade de escolher o candidato ideal devido aos esforços cognitivos associados a ter que mudar a atenção”. No inferno das notificações, a produtividade diminui, assim como a qualidade do trabalho. Isto pode significar chegar ao momento da pausa sem ter terminado as tarefas, o que passa a consumir tempo pessoal, “tempo de recuperação”. “E isso tem um impacto direto no bem-estar e na saúde mental, porque não há tempo para desconectar”.
Mesmo estando desligada do trabalho, estamos constantemente a receber as notificações. “Normalizamos muito isto, de estar sempre a alternar entre os diferentes mundos, e nunca estamos totalmente presentes ou a aproveitar o momento. E isso é realmente crítico para o bem-estar. ” Um estudo mostrou que a ansiedade e a depressão são maiores entre as pessoas que prestam mais atenção aos dispositivos do que aos amigos durante a socialização.
Esta problemática parece ser mais notória nos mais jovens, mas Anna Cox, professora de interação entre humano-computador na University College London, não concorda: “Não temos nenhuma evidência de que os jovens sejam mais prejudicados, do que qualquer outra pessoa.” Mas admite que uma das piores coisas sobre a tecnologia é que ela foi projetada para chamar a atenção. “Sinto muita empatia pelos jovens, que muitas vezes ganham o primeiro telemóvel quando têm 10 ou 11 anos, e ninguém lhes ensina a desligar as notificações. Então são constantemente bombardeados por essas coisas”, diz Cox, acrescentando que lamenta haver pessoas que não saibam como usar o modo noturno ou o modo de não incomodar. “Há muitos relatos de crianças que acordam durante a noite porque alguém lhes mandou uma mensagem. Quando percebemos que isto afeta o sono das pessoas, não é surpreendente que estas estejam stressadas e exaustas. ”
Esta especialista ressalta que não há evidências de que o inferno das notificações esteja a afetar as habilidades de concentração das pessoas de forma permanente. “Mas talvez haja uma mudança na forma como vemos o mundo”, diz. “O que gostamos mesmo é da novidade. Antes de termos acesso a toda esta tecnologia era muito difícil encontrar coisas novas”. Agora, especialmente se não tivermos desligado as notificações, há um fluxo constante de novos conteúdos disputando a nossa atenção.
Embora as notificações sejam pouco saudáveis para a nossa produtividade, para a capacidade e saúde mental, a ideia de ficar sem elas pode ser angustiante para alguns, como concluiu uma equipa de investigadores espanhóis e americanos, em 2017, quando pediram aos participantes que o fizessem durante 24 horas. Os 30 que aceitaram o desafio sentiram-se menos distraídos e mais produtivos, mas também se sentiram, diz o estudo, “não mais capazes de responder como esperado, o que deixou alguns participantes ansiosos. E sentiram-se menos conectados com [o seu] grupo social. ” Apesar destas conclusões, depois de participarem, cerca de dois terços deles pretenderam mudar a forma como geriam as notificações e, dois anos depois, metade tinham implementado esses planos.
“A luta é real ”, diz Anna Cox, mas há coisas que podemos fazer para minimizar o impacto das notificações. Actualmente já empresas, como a Microsoft, que afirmam estar a tentar tornar essas mensagens menos irritantes. “Na nossa pesquisa chegámos à conclusão que as notificações e interrupções podem ser valiosas e perturbadoras”, disse Mary Czerwinski, líder da pesquisa “compreensão humana e empatia”. O Focus Assist, diz, “tenta bloquear as notificações para que os utilizadores possam trabalhar sem distrações durante longos períodos de tempo”. E cada um pode definir um temporizador de foco.
Além disso, existem truques simples que podem ajudar, sugere Cox, “como colocar o telefone numa gaveta”, acrescentando que é possível ter dispositivos separados para o trabalho e a vida pessoal: alguns telefones Android permitem que existam dois usuários. Desativar notificações também é uma solução eficaz. Mas, refere a especialista, “não devemos ficar muito assustados e preocupados com isto. Não é cocaína”.
Sophie Leroy usa apenas e-mail e mensagens de texto, e desenvolveu uma estratégia simples de interrupções para reduzir a carga mental da troca de contexto, chamada de “plano para retomar”. Antes de verificar a notificação, diz: “reserve alguns segundos para anotar onde estava e, mais importante, o que ia fazer a seguir”. Isto ajuda o cérebro a fechar o que estava a executar. “Assim, estaremos mais focados no pedido de interrupção. E, quando retomamos, temos um rasto de onde estávamos e seremos capazes de retomar muito mais rápido. ”
Da mesma forma, se a notificação exigir uma ação, mas não for urgente, não a deixe pendurada: tome nota. “O cérebro não funciona bem com o que está pendente quando não há um plano de como lidar com a situação”, afirma esta especialista. Cada vez que a professora descarrega uma aplicação, desativa as notificações. “Este é o meu padrão”. Como Anna Cox acrescenta, “estas notificações servem para responder, e são muito eficazes. É por isso que todas as empresas as utilizam [notificações]. E também é por isso que precisamos de lutar contra elas, silenciosamente, desligando-as”.