A primeira referência escrita à mnemónica surge numa obra de Cícero, filósofo e político romano que viveu entre 106 a.C. e 43 a.C. Mnemosina era a deusa grega que personificava a memória. Na sua obra dedicada à oratória, Cícero apresenta o método de loci (plural de locus que significa lugar), conhecido popularmente por “palácio da memória”, como ideal para memorizar longos discursos.
O orador que segue esse método citado por Cícero cria uma casa imaginária e vai colocando a informação que quer memorizar em cada uma das suas divisões. Depois, à medida que as percorre mentalmente, consegue lembrar-se de tudo.
Mais corriqueiras e menos complicadas são mnemónicas como aquela que associa os meses do ano aos nós dos dedos das duas mãos ou a lengalenga que tantos de nós cantarolámos em miúdos para decorar facilmente a tabuada.
No dia a dia, todos estes truques estão a cair em desuso com a utilização, cada vez mais frequente, da “memória Google”, mas nem sempre é possível recorrer aos smartphones. É, por isso, bom saber que existem técnicas melhores do que a usada por Cícero (e ainda mais antigas).
Um novo estudo, realizado por uma equipa de investigadores australianos, agora publicado na revista científica PLOS ONE, demonstra que o método de memorização usado pelos aborígenes há mais de 50 mil anos é bem mais eficaz do que o “palácio da memória” da Grécia antiga. Os resultados obtidos pelos participantes foram tão inequívocos que a Escola de Saúde Rural da Universidade Monash, em Vitória, considera incorporar esta técnica no currículo de medicina, quando regressar o ensino presencial.
A equipa liderada por David Reser, da Universidade de Monash, começou por pedir aos 76 voluntários, todos eles estudantes universitários, que tentassem decorar uma lista de 20 nomes de borboletas. Ao fim de dez minutos, tinham cinco minutos para escreverem os nomes de que se lembrassem.
De seguida, os investigadores dividiram os participantes em três grupos, tendo sido ensinado o método grego a 25 deles e o aborígene a 26. Aos restantes 25 não foi ensinado nenhum método específico.
Durante trinta minutos, 25 estudantes aprenderam o método do “palácio da memória”, colocando mentalmente o nome de cada borboleta nas diferentes divisões da sua casa de infância.
O grupo de 26 que aprendeu o método aborígene caminhou num jardim e construiu uma história em que relacionava cada nome de borboleta a uma característica visível, como uma pedra ou uma planta. Depois, refizeram esse caminho mentalmente, recordando cada elemento da paisagem e nome.
Quanto ao último grupo de estudantes, foi-lhes pedido que decorassem os nomes, sem qualquer instrução.
Quando todos repetiram a experiência, descobriu-se que a utilização do método aborígene ajudou a memorizarem melhor os nomes das borboletas: 63% dos estudantes desse grupo lembravam-se de todos, contra 45% do grupo do método grego e 35% do grupo não treinado. Ou seja, o método aborígene foi 18% mais eficaz do que o grego.
Essa memória “privilegiada”, porém, desvaneceu-se rapidamente, notam os autores. Ao fim de seis semanas, quando se pediu aos mesmos participantes que recordassem novamente a lista de borboletas, aqueles que utilizaram a técnica grega foram os que se lembraram de mais nomes. Os estudantes que aprenderam o método aborígene tiveram o mesmo resultado do grupo não treinado.
David Reser sugere que o método aborígene “requer uma prática sustentada e uma exposição repetida” à paisagem para que a informação seja mais facilmente memorizada. “Parece um método mais adequado para um período de ensino único e relativamente curto”, conclui.