As camisas estampadas não são novas. Basta um pouco de memória e recordar “deuses” da música como os Beach Boys ou Elvis Presley com as suas inconfundíveis havaianas. E embora seja comum associar as camisas com padrões às culturas mais tropicais, como o Hawai e a Indonésia (onde esta peça está carregada de significado e é utilizada em cerimónias formais), e aos turistas, este paradigma está a mudar.
Tradicionalmente, “o homem português sempre fugiu das cores e dos padrões; é muito cinzento e pouco aventureiro”, diz João Jacinto, especialista em moda masculina e autor do blogue Gentleman’s Journal. Mas, hoje, são cada vez mais os que integram e procuram camisas estampadas. O que mudou? “Penso que uma grande parte dos homens esteja farta de usar, no trabalho, as camisas lisas e sóbrias e que ao fim de semana queira inovar.”

Esta ideia de quebra de padrões restritivos da sociedade é abordada por quem usa e por quem vende camisas estampadas. “A mensagem que gosto de passar, ao usar essas camisas, é a de que não ligo a formalismos, não os adoto, e seria tudo bem mais simples na sociedade se não nos importássemos tanto com o que os outros pensam”, sublinha Ricardo Santos. O jornalista de 45 anos, tal como o especialista de moda masculina, é crítico da associação de roupas sóbrias a competência profissional. A quebra de preconceitos é, também por isso, fundamental para compreender que usar camisas arrojadas é mais do que uma questão de estilo. Ricardo, editor da revista de viagens Volta ao Mundo, passou a usar camisas havaianas quase como se de um uniforme se tratasse.
“Nos últimos anos, temos assistido à emancipação dos homens e à libertação dos estereótipos com a evolução da sociedade”, explica João Jacinto. Também são as camisas havaianas e com padrões florais que mais convencem Luís Ferreira, fundador da Tribo do Sol, uma loja de surf e vestuário em Ílhavo, Aveiro. Influenciado pela modalidade e pelas idas ao Hawai, o empresário de 49 anos usa camisas estampadas desde os 16. “É um estilo de vida”, admite. “A indumentária informal é cada vez mais um must.”
Disso são exemplo as marcas portuguesas Otherwise e C.R.T.D (lê-se Curated), criadas em 2017 com o objetivo de conceber peças exclusivas e fora da norma. “A moda é uma forma de nos sentirmos incluídos na sociedade. Um veículo para exteriorizar criatividade, sentimentos, convicções e inspirações”, diz Manuel Ochoa Pires, cofundador da Otherwise. “Não podemos deixar que opiniões de terceiros ou ideias conservadoras preconcebidas interfiram no nosso processo de escolha”, defende.
Basta um pouco de memória e recordar “deuses”da música comoos Beach Boys ou Elvis
Também Miguel Marques da Costa, fundador e diretor criativo da C.R.T.D, acredita que a moda é uma forma de expressão. Deste modo, “usar cores inesperadas pode ser um statement ou uma forma de escapar da monotonia, de fugir dos clássicos que já temos no armário. É quase como um escape à norma e ao que consideramos tradicional”, declara.
E não há melhor forma de romper com a época do fast fashion e das cores sóbrias do que comprar camisas estampadas com edições limitadas: a Otherwise produz apenas 30 unidades por padrão e na C.R.T.D nenhum dos padrões fica disponível durante muito tempo, porque quando se esgota não é reposto. O mundo da moda está a mudar, e talvez este seja o “novo normal”. Sem descurar o estilo.
Arriscar nas meias
As calças mais curtas permitiram aos homens arriscar numa peça de roupa esquecida até então. Será que quem usa estas meias divertidas (como as da Happy Socks, na foto) está a liderar uma revolução subtil contra os uniformes? “Talvez seja um acessório que, por pouco dinheiro, nos dê alguma alegria e faça a diferença na nossa individualidade”, especula Manuel Gonçalves, administrador da Pedemeia, uma empresa portuguesa que se dedica à venda e produção de meias desde 1966 e que arrisca em cores e padrões variados. Mauro Rocha e David Silva, 30 e 40 anos, respetivamente, trabalham na área do desporto. David usa este tipo de meias como parte indispensável do equipamento. Chega a vestir meias de pares diferentes, e sempre chamativas. “É uma maneira de estar e, assim, diferencio-me”, conta. Mauro calça-as sempre que anda mais bem vestido, porque se identifica com esse estilo. “Quando passei a levá-las para o ginásio, os meus colegas começaram a brincar e a usar também”, garante. Todos concordam que é esta lógica que está por trás da propagação desta moda: um usa e outro vê, gosta e compra. “Muito embora as meias mais vendidas sejam as cores tradicionais, esta tendência de usar meias mais arrojadas manter-se-á, nomeadamente se tiverem alma e se forem bonitas e sofisticadas”, acredita Manuel.