Foi há já mais de 15 anos que Tim Bartholomaus, especialista em glaciares da Universidade de Idaho, nos EUA, correu uma das zonas costeiras do Alasca para montar instrumentos de recolha de dados ao ar livre – e reparou no fenómeno. Umas estranhas bolas que feitas de musgo pareciam pairar sobre o gelo. “Fiquei logo muito intrigado. Aparentemente, não estão presas a nada, como se tivessem apenas pousado sobre o gelo”.
Agora, na Polar Biology, Bartholomaus e os seus colegas adiantam o que já conseguiram perceber: segundo relatam, as tais bolas podem resistir anos e, ainda mais estranho, movimentam-se de forma coordenada – como se fossem um rebanho. “Geralmente, movem-se numa determinada velocidade e direção, mas tudo isso pode mudar ao longo do tempo.”
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Mas não se julgue que estas bolas verdes que brilham sobre o gelo nunca tinham sido vistas. Afinal, na década de 1950, um cientista islandês já tinha descrito algo semelhante no Journal of Glaciology. Chamou-lhes jökla-mýs, que à letra quer dizer “ratinhos do gelo”, descrevendo uma espécie de pedras rolantes embrulhadas em musgo.
Poeiras em movimento…
“Na verdade, em determinados ângulos, parecem mesmo pequenos mamíferos, tipo ratinhos ou esquilos, a mover-se lentamente sobre a camada de gelo”, acrescenta Sophie Gilbert, que é bióloga especialista em vida selvagem, também na Universidade de Idaho.
Do que conseguiu observar, cada bola é mais como uma almofada macia, mas molhada e coberta de musgo – acreditando ainda que aquelas bolas se formam a partir de algum tipo de impurezas ou poeiras. Já foram avistadas no Alasca e na Islândia, mas também na América do Sul, perto da região antártica. Não crescem propriamente numa determinada região, mas as grandes massas de gelo revelam-se uma das condições para surgirem.
Não são os únicos intrigados, que o diga Scott Hotaling, Washington State University, a sublinhar ainda que o movimento é essencial, para que toda a superfície da bola seja periodicamente exposta ao sol. “Ou então o musgo da parte de baixo não sobreviveria.”
…ao longo de anos
Essa possibilidade também já tinha sido apontada por outros investigadores. É que às vezes essas bolas eram avistadas literalmente a balançar numa espécie de altares de gelo. E estes erguiam-se à medida que as bolas de musgo isolavam o gelo que tinham em baixo – impedindo que derretesse à mesma velocidade das camadas em volta. Mas acabavam por não se aguentar ali muito tempo e rolar para longe.
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A tentarem comprovar este movimento, Gilbert e Bartholomaus marcaram 30 bolas com um pequeno pedaço de arame e uma sequência de identificação feita de contas coloridas. Ao longo de 54 dias, rastrearam a localização de cada bola. Primeiro em 2009 – e depois repetiram em 2010, 2011 e 2012. “Ano após anos”, recorda Bartholomaus, “foi possível comprovar que cada uma dessas bolas dura anos e anos. 5, 6, 7 anos… potencialmente mais ainda.”
Também o seu movimento se revelou peculiar. A expectativa era que fosse aleatória, a realidade muito diferente. O que as observações ditaram era que as bolas se moviam cerca de 2,5 centímetros, numa espécie de coreografia. Imagine-se um bando de pássaros ou um rebanho.
“Compreendemos ainda que, num determinado momento se moviam lentamente para sul. Mas depois desatavam a acelerar e a desviar-se para oeste – para a seguir voltar a diminuir a velocidade.
…e cheias de vida
Há várias hipóteses. A primeira, e mais óbvia, é que rolavam seguindo a inclinação do solo, como se fossem ladeira abaixo. Mas as sucessivas medições não confirmaram isto.
“Depois, pensámos que talvez fossem empurrados pelo vento”. Seguiram-se medições dos ventos dominantes nos locais. Mas nada. Nem isso nem seguiam a luz do sol, o que poderia ser outro padrão. “A verdade é que ainda não sabemos bem o que acontece”, remata o mesmo Bartholomaus.
Ruth Mottram, cientista climática do Instituto Meteorológico dinamarquês, observou o mesmo fenómeno na Islândia e acredita que a explicação terá um pouco de física e dos seus conceitos de cinética e de termodinâmica. O tema é tão fascinante que a discussão já saltou para o Twitter, claro.
“Quando vemos uma grande massa destas bolas é impossível não ficar fascinado”, sustenta Ruth Mottram, citada pela NPR, a rádio pública americana. “Fazem lembrar aquelas paisagens vivas dos filmes de ficção científica”.