Com este abrir da porta para deixar ver uma nesga de desconfinamento surgem as dúvidas sobre quando é que vamos voltar às grandes almoçaradas/jantaradas com família ou amigos. Provavelmente, não será este fim-de-semana. E quando é que podemos convidar os familiares mais próximos para uma refeição em nossa casa? Ainda não será nos próximos dias. Devo aceitar o convite para jantar em casa dos meus melhores amigos? As cautelas ainda são necessárias, porque como alertou o Presidente da República: “O fim do estado de emergência não é o fim do surto.”
Mais do que de distanciamento social, Henrique Lopes, 57 anos, professor de Saúde Pública prefere falar de distância física. “Mesmo que a expressão seja a correta do ponto de vista da etimologia da sociologia, do ponto de vista prático para os cidadãos leva a profundos erros – um deles é de que as pessoas se devem afastar. Deve haver distância física entre as pessoas, a variar consoante os países entre 1,20m, 1,40m, 1,80m e dois metros. Este é um vírus pesado, tende a cair literalmente ao chão a uma curta distância, já o vírus do sarampo, por exemplo, pode alcançar 22 a 24 metros de distância”, explica o docente do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica.
“Como seres humanos que somos precisamos de elementos gregários, por isso me tenho batido pela denominação de distância física, em vez de distanciamento social. O facto de durante este último mês e meio de confinamento as pessoas terem estado apartadas fisicamente umas das outras, isso agrava os muitos problemas de saúde mental que já existiam antes. Com a estabilidade emocional afetada somos os maiores consumidores de ansiolíticos da Europa. Se por um lado precisamos de distanciamento físico, por outro precisamos de uma aproximação social e não é apenas para revitalizar a economia”, alerta Henrique Lopes, membro da task force europeia científica de combate à Covid-19.
Terá de ser de uma forma higiénica que daqui para a frente se poderão começar a dar os primeiros passos. E nem tudo se resume se devemos ou não usar máscara. Na opinião deste especialista devemos ter o cuidado de quando entramos em casa de outra pessoa deixar os sapatos à porta, de seguida lavar as mãos e a cara, as zonas que estiveram expostas ao ar, com água e sabão ou com álcool gel, além de usar vestuário com manga comprida. Estas regras de higienização são para ser seguidas à risca. Mesmo a conviver entre conhecidos deve manter-se os dois metros de distância entre as pessoas. Sempre que alguém tossir ou espirrar deve fazê-lo para a prega do braço. É também preciso ter em consideração o estado de saúde de quem vamos visitar, se faz ou não parte do grupo de maior risco de contrair a Covid-19.
Mário Durval, delegado de Saúde Regional de Lisboa e Vale do Tejo vai mais longe e recomenda que a máscara social também seja usada dentro de casa, só a retirando para comer. “As pessoas têm de ter em mente como se transmite o vírus e isso só acontece de duas formas: pelas gotículas através da fala, da tosse e do espirro ou pelas mãos, que tocam em superfícies onde caíram essas mesmas gotículas, que depois tocam na boca, nariz e olhos”, relembra.
Sobre a realização de convívios entre familiares e amigos, Henrique Lopes recomenda “bom senso nesta fase inicial de desconfinamento, pois iremos ter muito possivelmente uma nova onda pandémica mais pequena. Não é igual conviver agora ou daqui a um mês”, adverte. Opinião corroborada por Mário Durval: “Por enquanto ainda é aconselhável que se retraiam a ir a casa de amigos e de família, porque não sabemos quem está positivo.”
No caso de se querer visitar doentes que integrem o grupo de risco, sejam doentes oncológicos, com diabetes, hipertensão ou insuficiência cardíaca, deve-se acrescentar mesmo o uso de máscara e luvas. “As pessoas com uma saúde mais débil não podem ser excluídas deste regresso gradual à normalidade. É preciso pensar como posso continuar a conviver com esta pessoa com o mínimo de dano possível? Os riscos que corro versus o que perco na relação com estas pessoas é globalmente vantajoso”, explica Henrique Lopes.
Nesta época de adaptações a novos rituais, os portugueses levam uma vantagem. “Somos o povo com mais higiene da Europa. Temos hábitos de higiene muito acima da média europeia, só precisam de ser reforçados. Por exemplo, apenas 25% dos holandeses lavam as mãos quando usam a casa-de-banho, por cá é o contrário. Praticamente todos os portugueses lavam os dentes, enquanto 30% dos franceses não o faz”, esclarece o especialista em saúde pública.
Esta terça-feira, 5, o subdirector-geral da Saúde, Diogo Cruz, na conferência de imprensa diária de atualização do estado da pandemia mencionou o limite de dez pessoas juntas: “Devemos tentar manter as regras que tivemos até agora, ainda que com mais liberdade e permissões. Mas como presumo que nenhum de nós queira uma segunda onda [de Covid-19], devemos manter as recomendações.” Para Mário Durval, “há sempre risco, nunca o vamos eliminar a 100%. Temos de nos habituar a viver com o risco e minimizá-lo ao máximo”.