Ontem, pelas janelas, muitos italianos cantaram uns para os outros, para aliviar a tensão e o medo. O meu filho de 9 anos ficou triste porque queria cantar com os seus amigos, como costumava fazer antes da quarentena forçada, mas eles moram em diferentes partes da cidade. Ele não os vê há mais de uma semana.
Depois de combinar com os outros pais, tentámos organizar uma chamada coletiva usando um dos muitos sites que permitem fazer videoconferências, para os miúdos se verem e tentarem cantar juntos, mesmo que à distância. Houve várias dificuldades, mas no final fomos capazes de ligar tudo – e a emoção de ver os sorrisos dos nossos amigos permaneceu, mesmo que a tecnologia não tenha permitido que a canção funcionasse.
Como chegámos a este ponto? Há pouco mais de duas semanas, as nossas vidas fluíam tranquilamente, indiferentes aos alarmes da China. Subestimámos o problema, mesmo quando o número de infectados começou a crescer. Agora existem 200 mortos. Por dia.
Porque ninguém nos falou claramente sobre a gravidade da situação nessa altura? Já tínhamos todas as informações da China. Mas na internet – nossa companheira obsessiva agora – circulam dezenas de informações diferentes e até contraditórias. Não podemos dar um passeio sozinhos no parque, mas podemos apanhar um autocarro lotado e ir trabalhar na fábrica, sem máscaras. Qual é o significado disto? Ainda hoje, li que o Reino Unido propõe uma estratégia completamente diferente da de Itália. Quem está certo, quem está errado?
Toda a gente escreve que a situação é “surreal”: é a palavra mais comum agora. Esse é, para mim, o problema mais sério: não conseguir distinguir o que é verdadeiro do que é falso, não encontrar as ferramentas para julgar e decidir o que é certo e o que não é. Mas a situação é real e cada dia de isolamento traz à tona quais são as coisas importantes da vida, especialmente se vivemos com crianças. O problema não é estar fechado em casa, mas a solidão, estar longe dos outros, primeiro à distância de um metro, agora nem isso. Sozinho em casa. Felizmente, a internet ajuda a encontrar substitutos, até que a emergência termine. Nessa altura, será importante lembrar o que aprendemos durante o nosso isolamento.