Desde as primeiras notícias que Luís Estanislau, preparador físico num clube da região de Wuhan, foi a voz dos portugueses que viviam naquela região da China. Correu tudo como esperavam?
Nós não sabíamos bem o que esperar. No nosso pensamento, mal o avião chegasse nós embarcávamos de seguida. Só depois tivemos noção que era uma operação gigantesca e de toda a sua complexidade.
Quem mais vinha nesse avião que vos trouxe de volta?
Sabemos que, no total, embarcaram pessoas de 25 nacionalidades. Os primeiros a entrar foram os franceses – imagino porque eram mais e porque foram as autoridades daquele país a organizar a viagem. Vinham na parte de trás. Já nós ocupámos a parte dianteira e posso adiantar que havia imensos lugares vazios. Como a viagem decorreu durante a noite aproveitámos sobretudo para descansar.
Quando chegara a Marselha, qual foi o procedimento?
Os passageiros só tiveram autorização para sair no momento em que podiam embarcar no avião previsto para os levar ao seu destino final.
À chegada a Portugal foram encaminhados para os locais onde vão cumprir os 14 dias de quarentena. Todos aceitaram a decisão sem questionar?
Sim, ficar de quarentena foi uma decisão tomada em conjunto e por unanimidade ainda antes de sairmos da China. Viemos todos de livre vontade [tanto para o Hospital Pulido Valente como para o Parque de Saúde anteriormente conhecido como Hospital Júlio de Matos].
As primeiras análises deram todas negativas. Está previsto que sejam repetidas?
Fizemos análises ao sangue e à saliva, além da recolha de líquido do nariz. Passámos também a tirar a temperatura três vezes por dia, já que a febre é um dos sintomas associados à infeção por este vírus. Julgo que as análises só serão repetidas no caso de alguém ter sintomas.
Como decorre a quarentena?
Sabemos que, se correr tudo bem, vamos ficar internados estes 14 dias. Cada um tem o seu quarto e a sua casa de banho e só partilhamos o refeitório. Bom, e ainda bem, que se não também não íamos aguentar não falar com ninguém.
Já sabem que está confirmada a infeção numa das mulheres belgas que vinha no vosso avião?
Sim, já sabemos. Mas está tudo calmo. Aliás, até enviei mensagem a um belga meu amigo que também regressou agora a perguntar-lhe se era ele. Pela sua conversa, percebi que a doente nem vinha junto a nós: quem tinha algum sintoma, por exemplo temperatura superior a 37º, viajava no andar de cima. Todos os outros, incluindo o grupo dos portugueses, vinha na parte de baixo do avião.
Em algum momento de todo este processo teve medo?
Medo, propriamente, não, mas receio, sim. Procurei proteger-me ao máximo e só saí de casa duas vezes mal se soube da epidemia. Só fiquei um pouco aflito quando se soube que o voo anunciado para sexta-feira [31 de janeiro] tinha sido adiado. É que tínhamos racionado a comida até àquele dia e não sabíamos se o atraso seria de muito tempo. A sorte é que foram só dois dias.
Quando acabar a quarentena vai voltar para a China?
Não, só voltarei quando – e se… – tudo voltar ao normal. Sei que pode demorar meses, mas as pessoas responsáveis do clube foram sempre muito compreensíveis com a situação. Aliás, foram os primeiros a aconselhar o regresso.