Entra-se no mercado de Alvalade, em Lisboa, e ouve-se de imediato a voz que sai de um microfone: “A forma portuguesa de tratar a dieta mediterrânica ainda não tem a expressão que merece.” Puxe-se uma cadeira, que Artur Gregório, da Associação In Loco, tem mais tiradas destas para explicar o MEDFEST. É ele o impulsionador deste projeto a três anos, com financiamento europeu (mais de dois milhões de euros) e a participação de oito países da bacia do Mediterrâneo – além de Portugal, Espanha, Itália, França, Grécia, Eslovénia, Croácia e Chipre.
Com o MEDFEST, a intenção é contornar o conceito básico de “sol e praia”, que alguns turistas se habituaram a associar aos países do sul. E ir mais além, criando destinos sustentáveis, baseados na gastronomia local e nos produtos sazonais. No fundo, é conhecer estes países através de experiências.
Tudo isto ganhou mais força desde que a Dieta Mediterrânica passou a ser considerada Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO, e ganhou uma sede em Tavira, no Algarve.
Artur Gregório revela que a máquina já começou a mexer há um ano e meio. Para ser ainda mais rigoroso, acrescenta que, na realidade, arrancou “há 30 anos, quando a In Loco se formou e passou a interessar-se pela genuinidade do território. Este projeto é o desenrolar natural do nosso trabalho”.
Essa máquina já reuniu 140 recursos identitários, que é como quem diz produtores, animadores turísticos e outros empresários de turismo. Agora, foi só “juntar tudo de uma maneira ótima, ter orgulho no que é nosso e fazer valor com isso”, resume o diretor da In Loco.
O que resultou dessa junção foi o primeiro mini guia a que chamaram de Viagens Mágicas à Nossa Terra (magical mystery tour), um roteiro self-drive, para se seguir ao gosto e ritmo de cada um. Começa em Lisboa e acaba em Tavira, por uma questão simbólica. “Trata-se de uma viagem para se fazer devagarinho, enquanto se explora o território. O próximo passo é avançar para a interpretação”, revela Artur Gregório.
O toque de saída dá-se no miradouro da Graça e depois de passar por várias terras alentejanas, como Arraiolos, Estremoz ou Monsaraz, chega-se ao Algarve, pela via menos óbvia – Alcoutim. Uma vez em Tavira, sugere-se uma refeição no mítico restaurante Noélia e Jerónimo. Haja lugares…
VÍTOR, O EMBAIXADOR
O MEDFEST há de acabar no final de 2019, com um festival na capital da Dieta Mediterrânica, onde se juntarão todos os representantes dos outros sete países envolvidos. A rota, essa, continuará com vida própria e com as devidas atualizações, à medida que se juntam mais parceiros. “A semente foi plantada no Algarve, mas isto não é uma coisa do sul. Baseia-se na identidade cultural do País e na nossa forma de ser e de estar”, garante Artur.
Enquanto isso, numa das bancas do mercado lisboeta, o chefe Vítor Sobral ensina a bem cortar uma cebola, tivéramos todos as suas facas. Mais, avisa que o tomate e o pimento nunca se devem comer com casca, para não se tornarem indigestos. De resto, já se adivinha: está num show cooking, a preparar uma caldeirada de robalo e uma marinada de raia.
Antes, já justificara o seu posto de embaixador do projeto, falando da origem desta forma de comer. “É a dieta dos pobres, em que se procura a sazonalidade os produtos e a maneira mais simples de cozinhá-los.” Vítor Sobral lembra um tempo em que, na cozinha, só entrava banha e azeite; carne de vaca nem vê-la. “A forma de comer à pobre é a melhor. Há que ter respeito por quem produz, por quem pesca e prestar atenção à qualidade do que pomos na panela.”
É para mostrar esse respeito que há por aqui coisas boas para provar e outras apenas para apreciar com os olhos, como as ervas aromáticas, os cestos ou os bonecos de Estremoz, que também são Património Cultural Imaterial da Humanidade. Ao som do grupo de cante alentejano de Pias (mais património), degustam-se enchidos, queijo de figo, vinho, azeite ou medronho. Com moderação e em convívio, como dita o estilo de vida saudável, com carimbo mediterrânico.