
Rede Ex-Aequo
Todas as sextas-feiras, o bar Invictus, na baixa do Porto, enche-se de jovens a partir dos 20 anos que querem experimentar a arte do transformismo. Entram gays, lésbicas, bissexuais, transgéneros, curiosos ou com dúvidas. Cobrem um enorme “etc” de identidades e as portas estão sempre abertas. “Somos inclusivos”, assegura Roberta Kinsky (Fernando Soares), transformista natural do Brasil com mais de 30 anos de carreira, dona daquele espaço noturno com shows na agenda todos os fins de semana. “Há cada vez mais gente a querer experimentar esta vertente do espetáculo, a vencer o preconceito e desafiar convenções. Mas ainda há um caminho percorrer”, garante. O caso é apenas um pequeno exemplo de libertação em relação aos papéis sexuais e sociais ditos “normais”. Roberta Kinsky denuncia existência de preconceitos “sobretudo dentro da própria comunidade gay”, mas o tema é de grande calado e a travessia tem ainda muito que se lhe diga, mesmo tratando-se apenas, no exemplo referido, da cena artística ou performativa.
Discutir tudo, sem tabus
Ora, até sábado, no Porto, esperam-se dias intensos destinados a reforçar os laços e o saber de quem ousa subverter as cartografias da identidade de género e da orientação sexual. Um deles, o 4º Encontro Nacional Jovens Trans, decorre dias 24 e 25 e quer desenrolar o novelo das experiências pessoais. “Vamos sobretudo desafiar as pessoas a contarem as suas histórias de pós-transição, ou seja, ouvi-las a propósito das dificuldades e do que tiveram que enfrentar para afirmarem a sua orientação e identidade”, explicou à VISÃO Vítor Silva, presidente da Rede Ex-Aequo, a única associação portuguesa de jovens lésbicas, gays, bissexuais, “trans”, intersexo e apoiantes, com idades compreendidas entre os 16 e 30 anos. “Temos de melhorar o conhecimento das pessoas, permitir que cada jovem diga o que pensa e como é que viveu o seu processo de transição e afirmação para contagiar outros, sem medo de partilhar experiências e receios, conquistas ou desafios”, explica o dirigente da Rede Ex-Aequo. A associação criou núcleos em várias cidades (Lisboa, Porto, Cascais, Coimbra e Funchal) destinados à discussão das temáticas LGBTI. Vítor Silva garante que a Ex-Aequo tem um programa ambicioso para este ano, no qual se inclui a realização de um primeiro acampamento de jovens em agosto, mas ainda falta dar um salto cultural. “Sinto que vivemos um tempo onde somos proibidos de discriminar, contudo, não somos educados a integrar”, explicou, numa recente entrevista ao dezanove, sítio online de notícias e cultura LGBTI, onde relatou casos de bullying em ambiente escolar e familiar por razões relacionadas com a autodeterminação sexual.
No sábado, 25, haverá também uma reunião aberta a jovens “Trans”, promovida pelos organizadores da Marcha do Orgulho LGBTI, no Porto (a realizar em julho), com objetivo de construir “uma marcha mais diversa, com maior visibilidade das pessoas trans” e reforçar “a luta contra a transfobia”. O evento inclui jantar e um ciclo de cinema sobre esta temática.
Já esta quinta, 23, começou, também na Invicta, dividido entre a Faculdade de Letras da Universidade do Porto e a Fundação de Serralves, o congresso internacional Intersexualidades – Cruzando Corpos, Cruzando Fronteiras, que decorrerá até domingo. A diversidade sexual, a discriminação, a violência, os discursos da Medicina, do Direito e da Literatura sobre as sexualidades e intersexualidades, as políticas do Estado, do corpo e da inclusão estarão em destaque nos diversos painéis e conferências. Para o encerramento está reservado um recital de poesia que fará uma revisitação às Novas Cartas Portuguesas, com a participação, entre outros, da professora universitária e poetisa Ana Luísa Amaral.