Publicar um artigo científico numa revista de prestígio, como a Cell, pode custar mais de quatro mil euros. Ou seja, o autor, ou o instituto, que vê o seu artigo aprovado para publicação, depois de um moroso e enervante processo de leitura, revisão e crítica, ainda tem esta bela fatura para pagar. O acesso aos artigos também não é barato: as assinaturas anuais, individuais, custam à volta de 200 euros. Um negócio muito lucrativo para as editoras, como o grupo Nature ou a Elsevier, com margens que atingem os 30 por cento.
“Publica ou morres” é um lema que os cientistas assumem logo no início da carreira. Mas o comissário europeu da ciência, Carlos Moedas, quer mudar as regras do jogo. Na verdade, dando voz às queixas, quase em uníssono, da comunidade científica. O tema tem vindo a ser discutido em Bruxelas, muito por impulso da presidência holandesa, que está a negociar diretamente com os grandes grupos editoriais das publicações científicas.
Depois da revolução na música ou nos media, será a vez da Ciência. E a Europa está a liderar o processo. Até 2020, todas as publicações resultantes de investigação financiada por dinheiros públicos devem ser disponibilizada em regime de acesso livre, anunciou Moedas. Num discurso em favor da ciência aberta, por razões “morais e científicas”, o comissário dá o exemplo do governo holandês, que tomou a dianteira, estabelecendo contratos de financiamento diretamente com as editoras.
Há já algum tempo que Miguel Godinho Ferreira, investigador do Instituto Gulbenkian de Ciência, deixou de publicar nas revistas pagas. “A Ciência deve ser gratuita, já que já foi paga por outras fontes [financiamentos públicos para os projetos]. O acesso ao que publicamos devia ser gratuito. Vai chegar o dia em que todas as publicações serão em acesso livre”, acredita. “Algo que os cientistas querem há anos”, sublinha.
Robin dos Bosques da ciência ou ciber-crimonosa?
Tendo em conta que o trabalho de revisão feito pelos cientistas é completamente gratuito, custa a aceitar que depois estes mesmos cientistas tenham de pagar balúrdios para ler os trabalhos dos pares e até os seus próprios. “Pagamos para escrever, publicar e ter acesso às revistas e sem qualquer direito de autor,” denuncia Miguel Ferreira.
Esta disputa tem um rosto: a neurocientista Alexandra Elbakyan, 27 anos, do Cazaquistão, que em 2011 criou o site SciHub, que permite ter acesso a quase 50 milhões de artigos científicos, de forma gratuita. A Elsevier pos-lhe um processo que limitou o acesso. Mesmo assim, continuam a existir formas de lá chegar, pelos sub-mundos da Internet. Há quem a veja como um Robin Hood da Ciência, outros há que a classificam de ciber-criminosa. Talvez seja, na verdade, uma pessoa à frente do seu tempo.