“Continue, que está a falar muito bem”, atirou, logo no início do frente a frente na RTP3, Vitorino Silva para Marisa Matias, dando um sinal do que viria a ser o resto daquilo que se pode chamar de conversa amistosa, porque esteve longe de se tornar um debate.
Aliás, só a gerigonça foi o maior divisor de águas – mas sobre o qual já não havia mais tempo para discutir. Ambos criticaram a presidência de Marcelo Rebelo de Sousa, com o presidente do partido RIR – Reagir, Incluir e Reciclar a ser o mais cáustico: “Tenho a certeza que o Marcelo Comentador tivesse de falar do Marcelo Presidente, acho que o comentador não estaria muito longe do que disse aqui hoje sobre o Marcelo”.
As frases que marcaram o debate:
Percurso político dos candidatos
MARISA MATIAS
“Estou a exercer funções políticas há 10 anos. Não pretendo exercer nestes cargos toda a minha vida. Comecei a trabalhar com 16 anos e quando cheguei ao Parlamento Europeu já tinha 34.”
“Não desvalorizo de forma alguma as sondagens. Mas há cinco anos estava também nestas condições com resultados inferiores aos deste momento. Há cinco anos, estava a um quarto dos votos de Maria de Belém e acabei por ficar à frente. Os resultados finais são os que temos de avaliar.”
Contexto: Além de ter assegurado o despreendimento da política, apostou num argumento que já no debate com Ana Gomes a eurodeputada do BE tinha acenado, de que as sondagens há cinco anos não a favoreciam tendo depois não só superado tais valores, como muito à frente da antiga ministra da Saúde.
VITORINO SILVA
“Sempre que fui a votos fiquei à frente de partidos que andam cá há muito tempo.”
Contexto: O presidente do partido RIR destacou os resultados que tem obtido eleitoralmente nas várias vezes em que foi às urnas, desde o primeiro sufrágio na freguesia de Rans, há mais de 20 anos.
Convergência de candidaturas
MARISA MATIAS
“Isso é um equívoco [alegada conversa com Ana Gomes sobre convergirem]. Conversámos como amigas que falam sobre estas coisas. Nunca o tema [fusão de candidaturas] foi tema de conversa.”
“Não acho que temos um excesso de candidaturas à Esquerda, acho que temos é uma demissão do partido do Governo em não ter avançado para estas eleições. Apresento-me como uma candidatura da Esquerda, à semelhança do que aconteceu em 2016, com apoios muito fora do Boco de Esquerda.”
“Temos sete candidaturas presidenciais e só três são à Esquerda.”
Contexto: Marisa fez questão de esclarecer a dúvida que ficou no ar após o debate com Ana Gomes: de que poderia haver uma convergência à Esquerda ou pelo menos que houve alguma negociação antes de as duas candidatas entrarem na corrida presidencial.
VITORINO SILVA
“A minha candidatura é uma candidatura de Esquerda mas às direitas.”
“”Há muitas empresas de sondagens que têm as suas sedes dentro das sedes dos partidos. Na última sondagem que fizeram puseram sem votos no Porto. Alguém acredita? Eu que consegui sete mil assinaturas no Porto. E não tenho votos de mulheres?”
Contexto: Vitorino Silva optou por não se comprometer com um campo político e apostou em criticar as sondagens que o têm ignorado.
Ação de Marcelo
MARISA MATIAS
“O Presidente da República foi já, no exercício das suas funções, uma força de bloqueio a entendimentos de Esquerda que eram importantes que tivessem vingado. Essa foi uma das características do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa que se vai prolongar.”
“Nas questões laborais, Marcelo Rebelo de Sousa aliou-se às entidades patronais do que aos trabalhadores. Se faz um acordo para tornar ainda mais precárias as condições dos precários, nomeadamente com o período experimental, claro que acredito que precisamos de ter alguém na Presidência da República que acrescente bloqueios.“
Contexto: Marisa Matias apontou as várias áreas em que Marcelo Rebelo de Sousa falhou, ao mostrar dúvidas e servir de força de bloqueio: a lei de bases da saúde, a venda do Banif e os apoios financeiros ao Novo Banco.
VITORINO SILVA
“O António Costa precisava do Marcelo e o Marcelo do António Costa. Andaram este tempo todo a embalar-se um ao outro. E embalaram-se porquê? O António Costa não queria deixar de ser um primeiro-ministro e Marcelo Rebelo de Sousa sabia que à segunda volta ia precisar do filão do Partido Socialista.”
“Tenho a certeza que se o PS votar em massa no Marcelo, e o Marcelo tenha 70%, a primeira pessoa a ser posta de lado vai ser o António Costa. Tenho a certeza. Porque Marcelo nunca mais vai precisar de António Costa. Eu não conheço facas de um quilómetro. E por isso António Costa tem os dias contados.”
“O Marcelo fez coisas muito bem e noutras coisas esteve distraído. [Sobre Tancos] tenho a certeza que sabia tudo. O comandante supremo das Forças Armadas? Neste país é muito mais fácil despedir diretores regionais do que um ministro”.
“Tenho a certeza que o Marcelo Comentador tivesse de falar do Marcelo Presidente, acho que o comentador não estaria muito longe do que disse aqui hoje sobre o Marcelo.”
Contexto: Foi apenas na avaliação de Marcelo que Vitorino Silva se soltou, tendo, pelas palavras irónicas, dado nota negativa à ação presidencial nos últimos cinco anos.
Pandemia e a União Europeia
MARISA MATIAS
” Em relação à vacinação, houve um trabalho de cooperação europeia notável. Mas há questões que ainda não estão respondidas: qual é a propriedade intelectual da vacina, se será dinheiro público ou privado e se a vacina será pública ou não.“
“[Sobre a ‘bazuca’] Os montantes não são suficientes, a proporção de subvenções e endividamento foi muito alterada. Começou por ser uma bazuca que era quase toda subvenções para passar a ser um instrumento de dívida.”
Contexto: Marisa criticou a ação dos países conhecidos como “frugais”, como os Países Baixos, que levaram a um redesenho do Fundo de Recuperação das economias europeias afetadas pela pandemia, diminuindo o valor das verbas a fundo perdido.
VITORINO SILVA
“Eu não duvido que o dinheiro vem [do Fundo de Recuperação]. Mas eu lembro-me que vieram sempre carradas e carradas de dinheiro [da Europa]. Mas o povo não vê. Temos mais de 700 mil pessoas sem médico de família. Vem tanto dinheiro para o SNS e gostava de saber se os candidatos têm médico de família.”
Contexto: O candidato mostrou-se descrente sobre o destino e a eficácia da vinda para Portugal de cerca de 40 mil milhões de euros para fazer face aos efeitos da pandemia.
Populismo
MARISA MATIAS
“O populismo é uma ameaça porque desvirtua as respostas que dá”.
VITORINO SILVA
“Às vezes é conversa demais e ação de menos [dos políticos]. É preciso por a ação à frente da conversa.”
“Em 900 anos de história , o povo teve sempre o papel de figurante, nunca teve o papel principal.”
Contexto: Num tom simples, Vitorino pôs uma tónica popular na sua candidatura.
Gerigonça
MARISA MATIAS
“Vitorino, e o aumento das pensões, o aumento do salário mínimo, as reformas antecipadas para as pedreiras de Penafiel? [A quem se devem].“
VITORINO SILVA
“Eu desconfio muito dos relógios com muitas peças.”
Contexto: Foi o único ponto em que ambos pareceram discordar profundamente, já que Vitorino Silva não foi um apoiante da solução encontrada à Esquerda, em 2015.