Está na Prisão do Linhó e resolveu escrever uma carta, a que a VISÃO teve acesso, como forma de denunciar o que diz serem as consequências da greve dos guardas prisionais nos reclusos. Fala de maus-tratos, de reclusos que ficam impedidos de receber visitas e correspondência ou de ir ao recreio e sem meios para terem uma higiene adequada. Diz mesmo que há quem nas forças de segurança consuma drogas e presos que são roubados pelos guardas e vivem em celas insalubres.
Faz esta denúncia, pedindo às autoridades competentes que investiguem as condições de vida nas cadeias e o impacto que a greve dos guardas prisionais está a ter nas prisões portuguesas.
Recorde-se que em 2022 o Comité Europeu para a Prevenção da Tortura visitou alguns estabelecimentos prisionais em Portugal e alertou para situações de agressões a reclusos por parte das forças de segurança, declarando mesmo que os “maus-tratos ainda são uma prática frequente” nas prisões portuguesas.
Em 2023, o Mecanismo Nacional de Prevenção da Provedoria de Justiça denunciava que quase 70% das prisões portuguesas estavam com lotação “de alto risco”, as celas coletivas eram pequenas, havia espaços degradados e sem condições e cada técnico de reinserção social tinha a seu cargo, em média, 54 reclusos, dificultando os projetos de reinserção na sociedade e prevenção de reincidência.
Este é um testemunho na primeira pessoa, que é também um pedido de ajuda às autoridades para que investiguem o que se está a passar.
“Eu (…) recluso nr. (…) no E.P. Linhó, venho por este meio comunicar a todos os portugueses as situações que se vive há praticamente 6 meses no estabelecimento prisional do Linhó.
Os reclusos do respetivo E.P. estão a sofrer de uma horrível opressão desde o início da greve dos guardas prisionais. Não se percebe o motivo da greve mas os boatos indicam que pretendem acabar com o regime de ativos e inativos e querem que o regime de inativos passe das 4 horas de pátio (2 horas de manhã e 2horas à tarde) para apenas 2 horas de pátio como se faz num regime totalmente fechado afim de os reclusos em estado inativo passaram para um regime de secção como se prática na cadeia do Monsanto.
Há períodos que passamos mais de 24 horas fechados, aquando mudança de turnos, sem acesso a lavandaria, os reclusos não conseguem lavar as suas roupas pessoais, nem de cama. Ao Bar só temos acesso uma vez por semana, muitos reclusos não conseguem ter acesso ao bar devido à escassez de produtos e aos conflitos gerados derivado a este problema.
Nos primeiros 4 meses de greve não tivemos acesso a sacos das visitas, aumentando a fome e a falta de higiene.
O acesso a correspondência é uma vez por semana para receber e enviar, independentemente da urgência da correspondência.
As condições neste estabelecimento prisional, são deploráveis convivemos diariamente com milhares de ratos que coabitam entre nós nas celas, humidade , sujidade imunda, bolor, musgo, o estado de salubridade é indigna ao ser humano.
Muitas vezes não temos direito a banho quente, o sistema de caldeira funciona muito mal como também há um mau funcionamento das águas sanitárias, foi implementado um horário para acesso a água quente gerido pelo E.P. (os guardas ) em que muitas das vezes não é cumprido.
Houve uma situação em que ficamos sete dias sem acesso a água, os reclusos ativos tinham acesso à água do poço, mas quando chegava altura de abastecimento para inativos esgotava a fonte. Mesmo com muita insistência por parte dos reclusos não arranjaram solução para acesso a água pelo menos potável, havia uma profunda apatia por parte dos guardas.
Muitos dos guardas neste e noutros estabelecimentos prisionais não cumprem com profissionalismo o seu dever, fazem por obrigação os serviços mínimos e castigam arbitrariamente reclusos, principalmente os mais vulneráveis.
Vive-se um constante terror por parte das forças de segurança, criando um clima instável entre a população reclusa causando mais atritos, falta de sanidade mental e suicídios, assuntos que a comunicação social abafa para dar lugar a reportagens sobre o consumo de drogas nas prisões.
Nota-se claramente o uso de substâncias por parte das forças de segurança, mas nesse assunto não se toca!
Os reclusos são roubados nas suas celas ficam sem direitos, sem higiene necessária, a sofrer castigos por cima do castigo imposto pelo tribunal.
O estado recebe apoios europeus para criar as dignas condições, as entidades recebem o dinheiro, os guardas são pagos! mas os reclusos são explorados nos seus trabalhos dentro das prisões, sem condições de higiene, alimentação, educação, desporto e de todos os pontos acima referidos.
Se estas situações forem investigadas de certeza que todas estas situações referidas vão estar no relatório.
Pois por ser verdade eu como recluso e sofredor das situações acima referidas peço em nome da população reclusa, que se possa fazer algo para alguma mudança.
Atenciosamente, com os melhores cumprimentos para todas as entidades competentes para investigar e ajudar na solução”
Editado a 30 de março de 2025, às 17h20, com a remoção da identificação do autor da denúncia, a pedido do próprio