As regras do estatuto dos titulares de cargos políticos são suficientemente claras para que não permitam interpretações enviesadas?
A lei é claríssima: impõe, aos titulares dos cargos políticos, um período de nojo de três anos, após a cessação de funções. Portanto, estes não podem exercer funções em empresas sobre as quais tiveram intervenção, ou seja: não podem estar num dia, enquanto titulares de cargos políticos, a financiar ou a conceder subsídios a uma determinada empresa ou instituição e, no final do exercício de funções, passarem a trabalhar para essa mesma empresa. Senão, teríamos aqui alguém a financiar com dinheiros públicos o seu futuro vencimento. Isto destina-se a assegurar a devida imparcialidade do tipo de funções e a evitar a natural tentação de se, enquanto se tem esse poder, preparar um futuro quanto a uma atividade posterior.
Mas, então, o que está na origem de alguns casos, como o mais recente que envolveu a ex-secretária de Estado Rita Marques e que foi criticado pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro? Má interpretação?
Não sei como a ex-secretária de Estado interpretou a lei, mas há um princípio legal que é muito básico e que todos os cidadãos são obrigados a cumprir: ninguém pode escudar-se na ignorância, no não conhecimento ou na má interpretação da lei. Com o devido respeito, acredito que a ex-secretária de Estado não ignorava, não poderia ignorar, e, positivamente, mediu as vantagens e as desvantagens de aceitar esta oportunidade concedida. E porquê? Porque a sanção é demasiado curta. Não há uma sanção efetiva para quem viola a lei neste segmento; a única consequência que pode haver, por ter sido governante, dado dinheiro ou ter tido influência direta sobre uma empresa, é não poder, nos próximos três anos, exercer qualquer outro cargo político. Ou seja: se não houver a intenção ou o desejo de se ser novamente titular de um cargo político, porque não aceitar, porque não há de violar a lei? É uma questão da consciência de cada um.