“Relativamente ao comportamento da pessoa que serviu neste Governo e no Governo anterior como secretária de Estado do Turismo aquilo que fez é ilegal e não corresponde ao que no meu entendimento é a ética república“. A declaração de António Costa foi lapidar no debate no Parlamento, esta quarta-feira, após ser confrontado com o caso da ex-governante Rita Marques, que rumou à empresa The Fladgate Partnership, ao ser contratada para trabalhar no projeto World of Wine (WoW), ao qual atribuiu benefícios fiscais quando estava no Executivo.
Questionado pelo líder do Chega, André Ventura, o primeiro-ministro começou por partilhar da interpretação legal do caso, tendo em conta que Rita Marques estaria obrigada a um período de nojo após a saída do Governo, para assumir tais funções: “Não me revejo na atitude. E se o deputado tem a certeza de 99% da ilegalidade, eu tenho 99,9%, porque admito que haja sempre um 0,1% das possibilidades da minha interpretação jurídica não estar certa”.
“O que fiz, quando li a notícia, foi pedir ao secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros para falar com a doutora Rita Marques, para a chamar à atenção para as limitações legais existentes, perguntando-lhe se tinha atribuído algum benefício de natureza contratual – seja de natureza fiscal, seja de incentivo financeiro -, e se tinha praticado algum ato relativamente àquela empresa. E ela entendeu – como já é público – que estava a coberto da lei. Não é a interpretação que faço. As autoridades competentes farão o entendimento que bem entenderem. Do ponto de vista da ética republicana, não tenho as menores das dúvidas que não corresponde à ética republicana alguém sair do governo e ir exercer funções para uma empresa relativamente à qual agiu diretamente”, detalhou Costa, que ainda assim, em resposta a Ventura, afastou a possibilidade de devolução de eventuais benefícios decididas no passado.
“Não devemos tirar as ilações sobre a validade de atos praticados. Do que tenho conhecimento, não houve da parte da doutora Rita Marques qualquer benefício fiscal que tenha sido atribuído àquela empresa nem estabeleço qualquer correlação entre uma coisa e outra. Quem conheça o hotel e aquela unidade, não me parece inverosímil que lhe seja atribuída a utilidade turística“, disse, salvaguardando que “relativamente ao comportamento da pessoa que serviu neste Governo e no Governo anterior como secretária de Estado do Turismo aquilo que fez é ilegal e não corresponde ao que é a ética república”.
Porém, já depois destas afirmações, Costa foi confrontado pela coordenadora do BE, Catarina Martins, com um historial de atribuição não só de benefícios fiscais, mas de outros tantos apoios à Wow, que poderão ter totalizado mais de 30 milhões de euros, no período em que a governante esteve à frente da pasta do Turismo. Aí, o primeiro-ministro assumiu que pode ser submetida a uma “reavaliação” esse processo. E mais: se houver indícios de que houve “um houve um toma lá, dá cá”, então aí a Justiça terá de tomar conta do caso.
Rita Marques entrou do Governo em outubro de 2019, para a equipa do então ministro da Economia, Pedro Siza Vieira. Acabou por sair, em novembro de 2022, por decisão do atual titular da pasta, António Costa Silva.
No último sábado, o Observador avançou que Rita Marques iria ser administradora da The Fladgate Partnership, que detém a WOW, que se constitui num quarteirão cultural com valências turísticas em Vila Nova Gaia. Confrontada pela SIC Notícias com a lei, que obrigaria por um período de três anos a não aceitar tal cargo, a ex-governante considerou “legítima” a sua decisão.
Esta quarta-feira, Catarina Martins aludiu à possibilidade de, no período em que Rita Marques esteve no Governo, terem sido atribuídos apoios à Wow de cerca de 30 milhões, de acordo com os cálculos do site Eco.