Durante dois dias, Gertrudes Pereira teve ataques sucessivos de choro, perante a inevitabilidade de não poder voltar a Vendas Novas, de onde partira com o marido, João Duarte, em busca do sonho de colonizar vários hectares de terra nas Figueiras, no concelho do Montijo. Ali, à exceção das quatro paredes, cedidas pela Junta de Colonização Interna (JCI), “não havia mais nada sem ser areia”, “nem um poço, nem um forno, nada”. “Aqui, têm de trabalhar no duro”, foram avisados pelas autoridades, logo à chegada. Na flor da idade, acabaram por ficar, ao contrário daqueles que desistiram, face às duras condições de vida, ou foram expulsos, por não cumprirem as regras. Agora nonagenários, estes primeiros habitantes da Colónia Agrícola de Pegões são o símbolo vivo de um vasto plano que o Estado Novo levou a cabo em sete áreas do País, onde nada mais existia do que terra pronta a desbravar.
Passaram sete décadas desde que centenas de pessoas, como Gertrudes e João, “saudáveis, com amor ao trabalho e sem serem comunistas”, como ditavam os editais, aceitaram entrar num projeto-piloto, que começou a ganhar dimensão após a II Guerra Mundial, inspirados em colonatos, como existiam, por exemplo, em Israel (kibutz) ou na então União Soviética (kolkhoz). Mas com uma vertente capitalista, como a levada a cabo em Itália para evitar revoltas nos campos, e de aproveitamento de extensas áreas de baldios e propriedades da Fazenda Pública.