Apenas 30 a 40% dos doentes diagnosticados com cancro oral numa fase já avançada conseguem ser tratados e, mesmo assim, as complicações na cavidade oral, que incluem problemas de mastigação e deglutição, são inevitáveis, assim explica João Braga, médico dentista e diretor clínico da Regiclínica, em Braga.
Mas como seria se os casos fossem descobertos prematuramente? Os prognósticos tornavam-se, certamente, mais animadores, já que, quando assim é, as taxas de sucesso do tratamento são superiores a 80% e os efeitos secundários são muito menos graves.”Identificar alterações suspeitas numa fase inicial permite prevenir as lesões pré-malignas logo no começo”, afirma o médico.
Isto não é sempre possível porque, por um lado, o cancro da boca surge de forma assintomática e, normalmente, só se torna doloroso quando já está num estágio muito avançado. Estima-se que, devido ao diagnóstico tardio, cerca de seis em cada 10 doentes com cancro oral morram nos primeiros cinco anos apóso diagnóstico.
Por outro lado, falta, também, alterar a forma como grande parte da população portuguesa olha para a saúde oral.
O que falha e porque falha
A não prevenção e, consequentemente, o diagnóstico tardio da doença são os principais motivos que justificam que Portugal seja o segundo país da Europa com maior taxa de incidência de cancro oral. “Tem muito a ver com a falta de conhecimento da doença e dos sintomas da população em geral”, refere o médico.
Da mesma forma, faltam as visitas regulares ao médico dentista, um hábito que é ainda colocado em segundo plano quando se fala de saúde. “Infelizmente, realizar consultas regulares de medicina dentária ainda não é uma realidade para a maioria dos portugueses”, diz, referindo que a saúde oral no País é, ainda, muito negligenciada.
Além disso, existem, também, comportamentos de risco associados, como o consumo de álcool e tabaco.
Prevenir é a chave
O prognóstico desta doença vai depender do estágio em que for detetada, daí a importância do autoexame da boca, um método simples mas muito eficaz para a deteção precoce do cancro oral, de acordo com o dentista. “A realização periódica de autoexames da cavidade oral melhoraria, sem dúvida, a deteção precoce deste cancro”, defende João Braga.
O objetivo é procurar algum sinal de alerta, como feridas que não cicatrizam, manchas que alteram a sua cor ou que não desaparecem, aftas demasiado prolongadas, nódulos, inchaços, dificuldade em engolir, mastigar ou até falar, sensação de dormência persistente, sangramento sem motivo aparente e mobilidade dentária anormal.
O exame deve ser realizado num local bem iluminado em frente ao espelho e as mãos e a boca devem estar limpas. Quem tem próteses removíveis, deve retirá-las. Depois, são estes os vários passos que devem ser seguidos:
– Observar e palpar os lábios (superior e inferior);
– Puxar os lábios e examinar internamente;
– Inspecionar o palato (céu da boca);
– Estender a língua para fora e observar;
– Levantar a língua até ao palato, palpar e observar o pavimento da boca com o dedo indicador;
– Inspecionar com atenção os bordos laterais da língua, procurando alterações visuais ou táteis;
– Afastar as bochechas e pesquisar internamente ambos os lados;
– Palpar com a polpa do indicador toda a gengiva superior e inferior;
– Comparar o lado direito e esquerdo do pescoço e procurar alterações palpando um lado de cada vez;
– Palpar cuidadosamente o contorno da mandíbula;
– Colocar a polpa do dedo indicador por baixo do queixo e inspecionar.
Mais frequente em homens, mas os casos em mulheres jovens estão a aumentar
Por ano, surgem, em Portugal, cerca de 1500 novos casos de cancro oral, sendo mais frequente em homens – a proporção é de 2:1 em relação ao sexo feminino – a partir dos 40 anos. Contudo, o número de casos em mulheres jovens está, diz o médico, a aumentar.
É fundamental, por isso, que todos os grupos, mais ou menos vulneráveis, conheçam os fatores de risco e sigam atentamente os sinais de alerta.
A taxa de sobrevivência a cinco anos para doentes com cancro localizado e detetado em fases precoces é de 83% , relativamente aos 32% para aqueles cujo diagnóstico é tardio e que, muitas vezes, cria metástases.