António Costa subiu ao púlpito na condição de secretário-geral do PS, mas não despiu o fato de primeiro-ministro. Houve política, mas sobretudo políticas, até porque quando Carlos César lhe deu a palavra o classificou como “o foco das nossas esperanças”. E houve um anúncio que se sobrepôs aos demais e à revisão dos dois anos e meio enquanto líder do Governo: no Orçamento do Estado de 2019, o último da legislatura, Costa vai introduzir um programa que ajude a sarar uma das feridas mais profundas da passagem da troika por Portugal, a emigração jovem.
“Temos de criar condições únicas e extraordinárias para aqueles que partiram e queiram voltar tenham condições para regresar a Portugal. Uma das principais priorirdades do PS no OE vai ser criar um programa que fomente o regresso dos jovens que partiram”, afirmou o secretário-geral socialista, arrancando o maior aplauso da intervenção que encerrou o 22º Congresso Nacional, que decorreu na Batalha.
Em 40 minutos e 36 segundos de intervenção, Costa visitou os principais eixos da moção, intitulada “Geração 2030”, que levou ao conclave socialista, mas elegeu a educação, a habitação e o mercado laboral como principais trunfos. A “chave do sucesso no futuro” explicou reside na formação e em melhor emprego, motivo pelo qual disse estar “orgulhoso por ter reduzido a taxa de abandono escolar de 14,2% em 2016” para, projetou, “10% em 2020”. Esse, apontou, foi o défice que mais gostou de corrigir – não o outro, o das contas públicas.
Reafirmando a aposta no ensino profissional, bem como o alargamento das vagas nas instituições universitárias e politécnicas, Costa atacou o Executivo que antecedeu o seu, o de Pedro Passos Coelho: “O discurso de que tínhamos licenciados a mais só conduzia ao fracasso.”
Daí ter referido que o Governo vai manter a linha estratégica de reforçar o apoio à formação pós-graduada e à investigação. E aí veio outro tema, que tem sido polémico devido ao boom imobiliário: Costa quer maior acesso à habitação, dinamizando o mercado de arrendamento – regulado -, porque, considera, “o mercado deixado solto e livre promove a segregação, a discriminação e a exclusão”.
Se é certo que o salário mínimo nacional tem crescido à razão de 5% ao ano desde que a gerigonça assumiu o poder, o primeiro-ministro não deixou de frisar que “é preciso estabilizar” o País no plano salarial e pediu aos patrões cuidados redobrados neste capítulo. Porém, num exercício de memória, Costa recordou que a sua máxima antes de chegar a S. Bento era “emprego, emprego, emprego” e evidenciou que “Portugal já gerou quase mais 300 mil postos de trabalho em termos líquidos”.
Ainda assim, sustentou, é preciso “melhor emprego”, motivo pelo qual regressou ao temas da precariedade e à vontade do Governo de “limitar as condições de contratação a termo”. Nesse pacote legislativo que estará a ser preparado, haverá um mecanismo para proteger quem acabar de chegar ao mercado laboral, dado que “ser candidato a primeiro emprego não significa ser candidato a emprego precário”.
Muito aplaudido pelos mais de 1800 delegados presentes no Exposalão, Costa virou-se muito para fora e pouco para dentro. Falou mais do País, e menos do partido – como é normal nos encerramentos dos conclaves partidários. Mas lá deixou notas – como poderia resistir? – em que combinou passado e futuro. Não falou de José Sócrates, embora dissesse que a reunião magna tenha servido para celebrar “todos aqueles” que deram o seu contributo nestes 45 anos de PS, “de Mário Soares a António José Seguro”.
“Temos honra da nossa história”, salientou, mas igualmente “confiança nas novas gerações de socialistas”, assegurou. Essa ressalva inicial foi, de resto, o pretexto perfeito para, já no final do discurso, mostrar que está atento aos delfins que marcam terreno e contam espingardas para o pós-costismo.
Por falar em “ismos”, num Congresso em que o “pedronunismo” (de Pedro Nuno Santos) pareceu tomar a dianteira na luta pela sucessão – face ao “medinismo” (de Fernando Medina) e “anacatarinismo” (de Ana Catarina Mendes) -, o líder em funções assinalou que existe uma geração “com enorme potencial para poder seguir com a bandeira do PS em punho e levá-la para a frente em todo este século”, alertou, como quem avisa que não tolera precipitações ou movimentações extemporâneas: “Não meti os papéis para a reforma.” Longe disso. Este, como se viu, é o seu tempo – em 2019 quer ganhar tudo o que tem para ganhar: regionais madeirenses, europeias e legislativas.