Os empréstimos do amigo Carlos Santos Silva são a pedra no sapato que falta tirar na segunda parte da entrevista de José Sócrates à TVI. Se José Sócrates usou a primeira parte da conversa conduzida por José Alberto Carvalho para desferir um fortíssimo ataque ao Ministério Público e à forma como o processo foi conduzido, espera-se que esta noite, no telejornal emitido em prime time, o ex-primeiro-ministro dê explicações sobre os dinheiros.
Como a VISÃO já publicou (ver Os códigos de Sócrates: garrafas de vinho em envelopes e uma mãe “depenadinha”), segundo cálculos dos investigadores Sócrates terá recebido do amigo um total superior a 1,2 milhões de euros. A compra da casa de Paris e as obras aí realizadas terão atingido os 3,5 milhões. Para a investigação, o dinheiro entregue a Sócrates, de diversas formas, e que servia para manter o seu estilo de vida e assegurar despesas diversas de familiares seus, era na verdade do primeiro-ministro, sendo o amigo apenas um fiel depositário e intermediário.
Na entrevista de segunda-feira, Sócrates criticou violentamente o Ministério Público. Apontou as baterias ao facto de o Ministério Público, mais de um ano passado sobre a sua detenção, não ter ainda deduzido acusação contra ele. E afirmou que o Ministério Público montou uma “campanha de terror” contra si, que atemorizou a sua família e criou um “espectáculo” com o intuito de criar um “clima de intimidação”. Criticou ainda o facto de o segredo de justiça ter sido sistematicamente violado, lembrando que no processo o inspetor que lidera a equipa das Finanças (Paulo Silva) ter declarado que as fugas só podiam ter provindo de si, do juiz titular do processo (Carlos Alexandre) ou do procurador da Rosário Teixeira. Paulo Silva pediria depois que lhe fosse realizada uma investigação para apurar se havia sido ele a “fonte” das fugas de informação.
“Toda a narrativa construída ontem [segunda-feira, 14] não tem qualquer suporte na realidade, por esta razão: o Ministério Público [MP] não é nenhuma associação criminosa que se dedica a aterrorizar famílias dos arguidos. O MP tem como objetivo o exercício da ação penal daqueles que cometeram crimes”, reagiu António Ventinhas, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, em declarações à agência Lusa.
O ex-primeiro-ministro defendeu ainda que à altura da sua detenção não havia no processo “qualquer indício de corrupção”, considerando ainda as acusações “falsas, injustas e absurdas”. Já António Ventinhas considerou, nas declarações que prestou à Lusa, que se trata de “uma investigação criminal pela prática de crimes relacionados com a criminalidade económico-financeira, a chamada criminalidade do colarinho branco. É isso que o MP tem feito, tem recolhido provas, têm-se formado fortes indícios que levaram à prisão preventiva”. O magistrado lembrou ainda que por várias vezes a prisão preventiva de José Sócrates foi confirmada pelo Tribunal de Instrução, para o qual a defesa do ex-primeiro-ministro recorreu.
“Ao fazer este juízo, de que não existe nada, e tendo em conta a circunstância de que o Tribunal da Relação confirmou, por diversas vezes, [a prisão preventiva], também teríamos de lançar a suspeita sobre este e sobre os juízes que intervieram no processo e que já confirmaram a decisão”, notou ainda António Ventinhas.
Na sequência da entrevista, Pedro Delile, um dos advogados de José Sócrates, defendeu a necessidade do processo ser arquivado. “A Justiça tem de reconhecer o erro e corrigi-lo”.
Durante a entrevista, José Sócrates criticou ainda o Partido Socialista. “Ao fim de seis meses, eu realmente o que contava não é que o PS interviesse no processo, mas que o PS dissesse: Desculpem, mas não será o momento de apresentarem as provas? Acham que isto não passou já tempo a mais? Não acham que o PS está a ser prejudicado por isto?”
VISÃO com Lusa