O Qatar teve um papel mediador fundamental para a negociação da trégua temporária entre Israel e Hamas, que deverá iniciar-se esta sexta-feira a partir das 7 horas da manhã. Esta “pausa humanitária” de quatro dias na Faixa de Gaza permitirá a libertação de 50 reféns detidos pelos Hamas em troca de 150 prisioneiros palestinianos que estão em prisões de Israel, assim como a entrada de ajuda humanitária em Gaza.
Desde o dia 7 de outubro, data em que o Hamas lançou um ataque a Israel a partir de Gaza que matou cerca de 1200 pessoas e fez 200 reféns, que se deu um escalar do conflito. Como resposta, Israel tem bombardeado a Faixa de Gaza, provocando 13 mil mortos à data de hoje, segundo as autoridades controladas pelo Hamas. A comunidade internacional tem feito pressão para que haja uma negociação sobre a libertação dos reféns e o cessar fogo. Um papel que tem dado relevância ao Qatar, que tem liderado as conversações. Mas porquê este país do Golfo Pérsico?
Envolvido desde o início
Ao longo das últimas décadas, o Qatar tem conquistado o título de mediador mais influente do Médio Oriente. Independente desde 1971, o Qatar tem estado, desde cedo, no centro de negociações entre Israel e Palestina. Doha, a capital deste país, mediou compromissos e negociações relacionados com a divisão de territórios palestinos, promovendo o diálogo entre Hamas e Fatah. Em 2007, o Qatar demonstrou apoio ao Hamas após um golpe na Faixa de Gaza, financiando a construção de infraestruturas, assim como a administração civil da região. Desde 2012 que a sede do Hamas está instalada em Doha.
“O Qatar tem tido uma posição objetiva, na qual utiliza incentivos financeiros para gerir e acalmar tensões e guerras entre Israel e o Hamas”, disse Sanam Vakil, diretora do Programa para o Médio Oriente e Norte de África da Chatham House, ao grupo de comunicação alemão DW.
Porquê a libertação dos reféns israelitas?
Com os ataques de 7 de outubro, o Qatar não condenou publicamente o Hamas, mas apontou o dedo à resposta israelita. Ainda assim, este país tem estado no centro da negociação dos reféns feitos pelo grupo árabe. Porquê? Dizem os diplomatas que o Qatar tem o desejo de ser considerado como um país neutro e conciliador no centro do Médio Oriente. Em 2008, permitiu um acordo que evitou uma possível guerra civil no Líbano, em 2020 permitiu o diálogo entre EUA e grupo Talibã, ainda que sem resoluções positivas, e em 2004 mediou o acordo que permitiu a libertação de dois jornalistas franceses capturados por uma milícia extremista no Iraque.
Agora, o Qatar terá o desejo de conquistar mais uma vitória no que toca ao seu papel mediador com a libertação de reféns israelitas. Dizem os especialistas que este feito irá agradar a comunidade internacional, especialmente os EUA, que têm uma base militar no Qatar. Assim, Doha passará a ter maior influência na comunidade internacional.
Mediação sem interesses?
O papel do Qatar como mediador deste conflito tem gerado reações díspares. Joe Biden, presidente dos EUA, e Antony Blinken, diplomata norte-americano, publicaram mensagens na rede social X a aplaudir o papel deste país do Médio Oriente, destacando a “parceria crítica” para as negociações. Também Tzachi Hanegbi, conselheiro de segurança nacional de Israel, diz que “os esforços diplomáticos do Catar são cruciais”.
Contudo, entre comentadores de todo o mundo, há quem não se mostre não agradado com o papel do Qatar. Há quem diga que os esforços feitos para a libertação de reféns não foram suficientes e quem acuse o país de ser cúmplice do Hamas, uma vez que tem no seu território a sede deste grupo.
”O Qatar opera numa espécie de zona cinzenta”, escreveu semana passada na revista New Yorker o jornalista americano Joel Simon. “Embora as autoridades do país digam que são guiadas por princípios humanitários e pelo desejo de reduzir conflitos e promover a estabilidade, usaram claramente do poder que têm para ganhar influência e visibilidade, uma postura que, acreditam, aumenta a própria segurança numa região volátil”, destaca. “Jogar em ambos os lados faz do Qatar um aliado valioso, e o Qatar sabe disso”.