A Nigéria, país da África Ocidental, possui uma das indústrias cinematográficas mais rentáveis do mundo: Nollywood. Entre o histórico de produções, destacam-se “drama, drama, drama e filmes românticos”, explica ironicamente, à VISÃO, um dos membros da companhia The Critics. Foi graças à monotonia da oferta de filmes no país que Victor Josiah e mais nove jovens começaram a gravar curtas-metragens com os seus telemóveis. “Se visse as primeiras gravações agora, não iria gostar porque não devem estar muito bem”, confessa, a rir-se. O talento foi-se desenvolvendo com o tempo, os elogios começam a chegar e até Hollywood já os ajudou com novos equipamentos. “Nós estamos à procura da verdadeira beleza, a nossa beleza”.
A ideia surgiu quando ainda não tinham equipamento específico de gravação e edição. “Eu e o meu irmão fomos visitar o nosso primo, que costuma ver filmes. Mas naquele dia surgiu uma conversa sobre o cinema. Já andávamos a criticar Nollywood há algum tempo e falamos da ideia de levar isto para outro patamar”, começa por explicar Victor. Na equipa, o nigeriano ocupa-se de tratar das luzes, mas outros jovens, entre os 7 e 27 anos, completam a companhia The Critics, como se autodenominam. O objetivo é mostrar a sua arte.
É entre a paisagem da cidade nigeriana Kaduna e efeitos especiais que as crianças e jovens deste grupo gravam as suas curtas. Apesar de serem exigidos instrumentos e programas específicos, estes atores e realizadores tiveram de se adaptar à realidade. Começaram por volta de 2015 a fazer experiências com a tela verde, improvisada com lençóis dessa cor. Através do website Wikipedia e de tutoriais do YouTube mergulharam na edição de vídeos. As cenas eram filmadas num telemóvel Samsung e mais tarde editadas também por eles. Em 2016 lançaram a primeira curta chamada “Redemption” e, atualmente, a companhia conta com cerca de 20 produções. “Isto foi o princípio e vê onde estamos agora”, continua Victor.
Todas as criações giram à volta da ficção científica. Quanto ao processo criativo, desde o brainstorm de ideias até à conceção, toda a equipa tem uma palavra a dizer. O jovem compara a criação artística à culinária: “Todos adicionam ingredientes para fazer um prato de mestre. Eu vejo naves espaciais e alguém pergunta porque não adiciono dragões. No final do dia, aquilo que fazemos é acrescentar o que achamos que é preciso”.
Entre luzes, vórtices de fogo ou braços biónicos, Victor diz que o método é “flexível”. “Escrevemos uma lista das cenas que queremos gravar, vamos lá para fora, filmamos e, se depois precisarmos de mais, vamos adicionando cenas”. O talento da edição vai melhorando, mas, quando complica, podem sempre contar uns com os outros.
Da Nigéria para o mundo
Foi com o trabalho de equipa, talento, criatividade e determinação que a companhia alcançou mais uma vitória em 2020. Em agosto, J. J. Abrams, conhecido produtor e realizador americano, enviou um carregamento de equipamento cinematográfico para o grupo de jovens. Computadores, estabilizadores e câmaras foram as encomendas que mais faziam falta e que permitiram que os nigerianos melhorassem a sua presença na indústria.
Para o futuro, o objetivo é claro: “Passar de curtas para longas-metragens”. Até agora, a ideia de fazer filmes maiores não era possível no modelo em que operavam, principalmente por falta de eletricidade adequada. Com material específico e cada vez mais reconhecimento, o futuro pisca-lhes o olho. “Quero que as pessoas vejam os nossos filmes e se sintam inspiradas. Queremos continuar a trabalhar”.
Por enquanto, os dez jovens prosseguem com o sonho e aumentam as visualizações a cada dia. “Eu queria ser conhecido na minha turma como realizador e ator. Agora temos atenção global, reconhecimento global… A tua reputação precede-te”, atira Victor, enquanto se ri de orgulho, com uma das citações mais conhecidas da indústria de Hollywood.