Cresceu a sonhar que iria ser jornalista e relatar os jogos de basquete e de futebol norte-americano nos microfones e nos ecrãs do ESPN, o mais conhecido canal de desporto dos EUA. Os amigos e colegas de escola achavam piada a esta ambição de Gretchen Whitmer – logo ela, que não tinha grande jeito para nenhuma modalidade em particular e a quem chamavam “Gretchen Gravity” pela sua falta de coordenação motora e tendência para quedas aparatosas. Aos 22 anos, quando tinha já concluída a licenciatura em Ciências da Comunicação, a jovem candidata a repórter seguiu o conselho do seu pai, um prestigiado advogado com simpatias pelo Partido Republicano. “Poucas pessoas sabem como funciona o Governo (…). Independentemente de o teu futuro passar por aí, talvez seja útil”, explicou-lhe Richard Whitmer, sugerindo que ela fizesse um estágio no Parlamento estadual do Michigan, cuja capital é Lansing. A proposta foi aceite, e seis meses bastaram para que a rapariga apanhasse o “bicho da política” e, para surpresa do progenitor, se tornasse apoiante do Partido Democrata. A militância e as exigências do setor público levaram-na a tirar também o curso de Direito. Estava lançada a carreira de uma mulher quase sempre descrita como inteligente, ambiciosa, com sentido de humor e excelentes dotes oratórios.
Graças à pandemia e a Donald Trump, Gretchen Whitmer, 49ª governadora do Michigan, é agora uma figura nacional e aclamada pela maioria dos seus compatriotas. Em março, o “estado dos Grandes Lagos” tornou-se um dos epicentros da Covid-19, a par de Nova Iorque e de Nova Jérsia, e ela foi das primeiras governantes a tomar medidas: declarou o estado de emergência, mandou fechar escolas e empresas, e pediu ao Executivo federal, em Washington D.C., que adotasse uma estratégia clara de combate à doença. A Casa Branca não gostou do reparo e Trump, como de costume, respondeu no Twitter e na Fox News, acusando “a mulher do Michigan” de ser uma ingrata e dizendo que só ajudaria quem “apreciasse” os esforços presidenciais. A visada respondeu à letra e na mesma rede social: “Olá, o meu nome é Gretchen Whitmer e sou a tal governadora. Pedi ajuda de forma repetida e respeituosa. Não é de ataques políticos que precisamos, apenas EPI [equipamentos de proteção individual], ventiladores, máscaras N95, kits de teste. O senhor disse que estava do lado do Michigan, prove!”
A refrega verbal daria depois lugar a um conjunto de manifestações em Lansing – mas também em Saint Paul (Minnesota) e Richmond (Virgínia) – contra as restrições e os confinamentos, em que os apoiantes de Trump protestaram de forma intimidatória. Muitos cartazes comparavam Whitmer a Hitler, algumas pessoas exibiam armas automáticas e vários grupos no Facebook ameaçaram linchar, enforcar ou fuzilar a governadora que poucos conheciam até há poucos meses. Toda esta notoriedade fez com que o candidato democrata às eleições de novembro, Joe Biden, pondere desafiá-la para que ambos formem o ticket presidencial. Nos próximos dias, saberemos se a dirigente do estado onde já morreram mais de 5 200 pessoas com Covid-19 e que apresenta uma taxa de desemprego superior a 22% pode irritar ainda mais Donald Trump.
Roleta para a Casa Branca
Principais candidatas do Partido Democrata à vice-presidência, além de Gretchen Whitmer:
Amy Klobuchar
A senadora do Minnesota, de 60 anos, pode ser uma aposta de Joe Biden para conquistar o eleitorado centrista e do Midwest
Elizabeth Warren
A senadora do Massachusetts, de 70 anos, pode ser um trunfo junto do eleitorado mais progressista
Kamala Harris
A senadora da Califórnia, de 55 anos, pode consolidar o voto afro-americano
Stacey Abrams
A carismática ex-congressista da Geórgia, de 46 anos, pode ser essencial para o voto dos estados conservadores do Sul