Primeiro, anunciaram-se 80 mortes, depois de mais de 20 mísseis terem sido atirados sobre duas bases americanas instaladas no Iraque. Depois, ouvimos Donald Trump garantir que tinha sido um ataque sem baixas. A ajudar, as imagens divulgadas pelas agências noticiosas, de uma cratera que resultou do disparo de um daqueles mísseis – e que deixava claro que os danos anunciados eram mais do que limitados. Dava logo a entender que aquele comunicado das dezenas de mortes do ‘inimigo’ servira, antes de mais, para apaziguar ânimos mais exaltados do povo iraniano, depois do abate do general e estratega militar Qasem Soleimani.
As suspeitas adensaram-se ao longo de quarta-feira, 8, enquanto se esperava pelo discurso de reação ao ataque, prometido por Donald Trump. No Twitter, Javad Zarif, ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros, garantia que fora apenas um exercício de autodefesa e que o país não estava à procura de uma escalada de tensões que pudesse levar à guerra.
Pouco depois, surge a garantia de Trump: não houve quaisquer baixas entre os militares afetos às bases, nem danos nos edifícios. E, embora se dissesse pronto para tudo, a verdade é que também salientou que os ânimos no Irão estavam a acalmar – ao mesmo tempo que apelava por mais apoio para trazer aquele país novamente à mesa de negociações sobre o nuclear.
Acontece que, como avança a Slate, os avisos do lançamento dos misseis chegaram muito a tempo aos ouvidos dos americanos, graças aos sistemas de alerta precoce, e isso é só uma das razões que leva as autoridades dos EUA a acreditarem que os iranianos evitaram qualquer baixa de forma deliberada.
Mas nada disto se ouviu na televisão estatal iraniana. Ao que noticiou, entretanto, a agência Reuters, ao longo de toda a terça-feira, 7, manteve-se sempre a tese dos “80 terroristas americanos mortos” e dos “danos pesados nas bases”, a dar força ao que o aiatolá Ali Khamenei classificou de “resposta esmagadora” para vingar o assassínio de Soleimani. Como se aquele regime se visse obrigado, para manter a credibilidade interna, a responder à morte do seu general querido, mas não se pudesse dar ao luxo de entrar numa guerra sem fim com a América de Trump. Isso já explica que se tenha lançado um ataque menor, de forma a que o inimigo o consiga evitar, enquanto se diz internamente que foi um golpe devastador.
Depois, para acabar com qualquer dúvida que houvesse entre os iranianos, dava-se novamente conta, mais à noitinha, da explosão de mais dois rockets, na zona verde de Bagdad – que é onde estão o parlamento e os serviços do governo iraquiano, além da embaixada dos EUA no País. Mas que é também considerada das zonas mais seguras da cidade. Mais uma vez, não houve quaisquer baixas.