No domingo à tarde, o ministro britânico para o ‘Brexit’, Dominic Raab, fez uma visita imprevista a Bruxelas para tentar resolver pessoalmente “questões importantes” com o negociador chefe dos 27, Michel Barnier, mas sem sucesso.
Poucas horas depois, o ministério emitiu um comunicado admitindo que, apesar dos progressos em algumas áreas cruciais nos últimos dias, “continuam por resolver uma série de questões relacionadas com o ‘backstop”.
Em causa está o expediente a aplicar na fronteira entre a Irlanda do Norte, território britânico, e a República da Irlanda, membro da UE, se até dezembro de 2020, fim do período de transição previsto, não estiver fechado um acordo comercial entre as duas partes.
A “solução de recurso” [‘backstop’] é necessária porque tanto Londres como Bruxelas querem manter uma fronteira aberta e evitar controlos sobre pessoas e mercadorias, uma condição do acordo de paz de 1999 que pôs fim ao conflito entre republicanos católicos e unionistas protestantes.
Tusk rejeitou a proposta feita pelo Reino Unido de estabelecer uma zona de comércio livre de bens e produtos alimentares com a União Europeia após a saída da UE, alegando que “não iria funcionar” porque ia contra os princípios do mercado único europeu.
Para a primeira-ministra britânica, este modelo cumpriria o desígnio do referendo de 2016 de passar a controlar a imigração, pois estaria fora da obrigação imposta pelo mercado único de aceitar a liberdade de circulação de pessoas, e resolveria o dilema criado pela proposta da UE de alinhar apenas a Irlanda do Norte com as regras do mercado interno.
Este último cenário implicaria introduzir o que Barnier descreveu como “procedimentos administrativos” sobre mercadorias entre a Irlanda do Norte e o resto do Reino Unido que equivaleriam, no entender de Theresa May, a uma “fronteira” no Mar da Irlanda, algo que rejeitou liminarmente.
A alternativa tem a oposição firme do Partido Democrático Unionista (DUP), que rejeitou quaisquer “barreiras comerciais” da Irlanda do Norte com a Grã-Bretanha, a ilha onde estão Inglaterra, País de Gales e Escócia.
A opinião do DUP tem importância porque são os 10 deputados do partido ultraconservador que sustentam a maioria do partido Conservador na Câmara dos Comuns e um voto contra o governo, por exemplo, no orçamento de Estado, dentro de semanas, poderia desencadear uma moção de censura a Theresa May.
E no domingo surgiu uma nova frente formada pela líder do partido Conservador na Escócia, Ruth Davidson, e do ministro para a Escócia, David Mundell, que, segundo a BBC, ameaçaram demitir-se se fosse criado um novo estatuto para a Irlanda do Norte porque tal “minaria a integridade” do Reino Unido pois daria argumentos aos nacionalistas escoceses.
Nos últimos dias, especulou-se que May estaria disposta a aceitar uma permanência temporária de todo o Reino Unido na união aduaneira até ser fechado um acordo comercial, mas, ao tentar apaziguar o DUP, irritou os seus próprios ministros.
Vários jornais da imprensa britânica dão conta de que Andrea Leadsom, Penny Mordaunt ou Esther McVey estão descontentes com a ideia de May ao ponto de ponderarem a demissão.
O veredito poderá ser dado na terça-feira, véspera do Conselho Europeu, quando está previsto um conselho de ministros britânico que pode produzir mais um volte-face neste processo.
No domingo, o antigo ministro para o ‘Brexit’ David Davis escreveu um artigo no jornal Sunday Times em que apelou aos antigos colegas para se revoltarem contra o plano que qualifica de “completamente inaceitável”.
“Está na hora de o governo exercer sua autoridade coletiva. Esta semana a autoridade da nossa constituição está em jogo”, exortou Davis, que se demitiu em julho em desacordo com a estratégia da primeira-ministra e defende um acordo de comércio semelhante ao que a UE tem com o Canadá.
Em setembro, no final de um encontro informal em Salzburgo, na Áustria, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, considerou que o encontro desta semana seria “o momento da verdade”, enquanto que o presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker, falou na necessidade de “progresso significativo”.
A pressão para contornar o impasse e fechar um acordo de saída poderá levar Londres e Bruxelas a adiarem soluções definitivas para um encontro extraordinário dos 28 em novembro ou mesmo para o Conselho Europeu de dezembro.
Todavia, apesar de ter repetido que preferia sair sem acordo do que ter de aceitar um mau acordo, Theresa May não desistiu, assegurou um porta-voz no domingo ao final do dia, referindo que o governo britânico “ainda está empenhado em fazer progressos no Conselho Europeu de outubro”.
com Lusa