O governante, que abriu durante a tarde em Lisboa a apresentação da Estratégia de Cooperação Portuguesa 2030, documento enquadrador dos próximos sete anos, salientou aos jornalistas que “o mundo está a mudar muito rapidamente e muito radicalmente também, e a cooperação portuguesa tem naturalmente de se adaptar”.
A cooperação portuguesa “tem uma larga experiência” e “muito trabalho” desenvolvido nas áreas da educação e da saúde, e “esse trabalho vai continuar”, mas ao mesmo tempo vai ser introduzida “uma preocupação nova em relação a grandes temas globais, como sejam o combate às alterações climáticas, o apoio à biodiversidade, a questão do empoderamento das mulheres – a igualdade de género vai ser uma prioridade transversal em todas as áreas da cooperação portuguesa”, apontou.
“Ao mesmo tempo, centrando sempre nas novas relações privilegiadas com os países de expressão portuguesa, iremos alargar o âmbito [da cooperação] a outros países, como Senegal, Quénia, Gana, países com quem podemos desenvolver uma relação mais próxima e também, na América Latina, a Colômbia e o Chile”, acrescentou.
A “relevância” de Portugal “em matéria de política externa europeia, deriva, em parte, precisamente, da [sua] proximidade a países em outras geografias, em África, na América Latina e no continente asiático”, e a que a estratégia hoje apresentada reconhece a “realidade e tira proveito da dinâmica positiva que dela resulta”, afirmou no seu discurso, na Fundação Gulbenkian, o chefe da diplomacia portuguesa.
“Toda e qualquer iniciativa de cooperação bilateral ganha relevância e visibilidade acrescidas ao ser devidamente enquadrada no ecossistema internacional”, referiu, perante os vários atores da cooperação presentes, sendo que este posicionamento resulta numa segunda vantagem que a nova estratégia aposta em explorar.
Nos termos de Gomes Cravinho, o documento constitui “uma abordagem que está muito em coerência com as principais tendências internacionais”.
“Isso permite-nos uma […] inovação, que é alavancar de forma mais sistemática as vantagens da cooperação portuguesa através de financiamentos multilaterais, em particular, de financiamentos europeus”, acrescentou.
Segundo enquadrou o governante, “a comissária Urpilainen [Jutta Urpilainen, responsável no executivo europeu para as Parcerias Internacionais, que participou na sessão através de uma mensagem gravada] diz com frequência que estamos a assistir a uma mudança de paradigma de ‘cooperação para o desenvolvimento’ para ‘parcerias internacionais'”.
“Chegou o momento de aprofundar a consolidação deste novo paradigma que Portugal subscreve, seja no âmbito europeu, num formato triangular ou regional ou ainda, e não de menor importância, na esfera multilateral, aumentando por inerência, a influência da nossa muito experiente cooperação”, declarou Cravinho.
“A abordagem [da estratégia europeia] Equipa Europa, o potencial inerente à implementação do Global Gateway e o Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional (IVDCI) — Europa Global, em que trabalhámos durante a nossa Presidência do Conselho da União Europeia [no primeiro semestre de 2021], cristalizam de forma evidente essa mudança em curso”, concretizou.
O documento recebeu a aprovação generalizada de vários intervenientes na sessão que decorreu ao longo da tarde, mas, como sublinhou a presidente da Plataforma das ONGD (organizações não-governamentais de desenvolvimento), Ana Patrícia Fonseca, “tudo” o que está desenhado só será realidade se vier a ficar consagrado no Plano Operacional da Estratégia.
Plano que o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Francisco André, prometeu que será concluído e lançado a discussão pública “até ao final do primeiro semestre”.
“Tudo o que não estiver no Plano Operacional não será feito”, alertou Fonseca.
Desde logo, a calendarização do aumento da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD), que em 2021 — os últimos dados disponíveis — se ficou em 0,18 do Rendimento Nacional Bruto (RNB), num montante total na ordem dos 38 milhões de euros, muito aquém dos compromissos assumidos por Portugal junto da OCDE de destinar 0,7% do RNB à sua política de cooperação.
“Acreditamos que em julho estará concretizado como o aumento da APD será feito”, afirmou Ana Patrícia Fonseca.
A presidente da Plataforma das ONGD elogiou os “esforços de coordenação” e “coerência das políticas”, assumidos no sistema de governação da estratégia, desde logo, através da presença e papéis reforçados da Comissão Intergovernamental de Cooperação (CIC), do Fórum de Cooperação para o Desenvolvimento (FCD), do instituto Camões ou mesmo da Assembleia da República.
Outra das notas sublinhadas por Ana Patrícia Fonseca foi a da importância da avaliação intercalar e final inscritas no documento, que serão públicas, a serem conduzidas por uma comissão de acompanhamento, que será criada no âmbito do FCD.
A importância do mecanismo de acompanhamento e avaliação agora introduzido foi igualmente sublinhada por Raquel Freitas, professora do Iscte — Instituto Universitário de Lisboa, especialista em assuntos de Cooperação. “É muito bem-vinda a questão da avaliação e acompanhamento”, disse, mas alertou que “é importante que depois seja consequente”.
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