Nove meses antes da resolução do Banco Espírito Santo (BES), decidida em agosto de 2014, o Banco de Portugal (BdP) teve conhecimento de factos que punham em causa a idoneidade de quatro administradores do banco, entre os quais o presidente Ricardo Salgado. O vice-governador do BdP responsável pela supervisão, Pedro Duarte Neves, recebeu a 8 de novembro de 2013 uma nota informativa, elaborada por técnicos do banco central, onde era sugerida a reavaliação e admitida a retirada da idoneidade de quatro membros da administração – o que, na prática, conduziria à sua demissão.A informação foi revelada na primeira parte da reportagem Assalto ao Castelo, transmitida quarta-feira, dia 1, pela SIC. Os administradores cuja idoneidade foi questionada pelos técnicos do BdP eram, além de Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires, José Maria Ricciardi e Paulo José Lameiras Martins.
A reportagem da SIC defende que o governador do BdP, Carlos Costa, omitiu esta informação ao Parlamento, ao declarar, na Comissão Parlamentar de Inquérito à queda do BES, que o supervisor nada podia ter feito para afastar os responsáveis do banco em finais de 2013, por não dispor de “factos demonstrados” para tal atuação. Terá, por isso, optado por montar um “cerco persuasivo” que levaria ao afastamento da equipa de Ricardo Salgado em junho de 2014, cerca de mês e meio antes da resolução do banco.
Horas depois da emissão da reportagem da SIC, o BdP manteve, em comunicado, a versão do governador no Parlamento, defendendo que “no final de 2013, o Banco de Portugal não dispunha de factos demonstrados que – dentro do quadro jurídico então aplicável e atenta a jurisprudência dos tribunais administrativos superiores – permitissem abrir um processo formal de reavaliação de idoneidade dos administradores em causa.” E sublinha que a referida nota informativa “refere expressamente que a informação existente à data tinha que ser devidamente verificada e confirmada para efeitos de eventuais ações ao nível da idoneidade”.
O comunicado recorda ainda que “no que se refere ao caso concreto de avaliação de idoneidade de administradores do Grupo BES, foram desenvolvidas várias diligências pelo Banco de Portugal junto dos próprios – nomeadamente através da troca de comunicações escritas e da realização de reuniões presenciais – bem como junto de outras entidades”, processo esse que “conduziu à apresentação pelo Dr. Ricardo Salgado, em meados de abril de 2014, da calendarização da sua sucessão e de um plano que pressupunha a saída dos membros da família do órgão executivo do BES.”
Num segundo documento interno do BdP, referido pela SIC, são relatadas práticas pouco transparentes de gestão e falhas generalizadas nos controlos internos apurados em 20 sucursais e filiais do BES em Portugal e no exterior, nomeadamente na filial de Angola (BESA) e na de Paris (La Vénétie), entre março de 2011 e abril de 2012. Mais uma vez, o supervisor nada terá feito para resolver a situação.
Na segunda parte da reportagem, a exibir esta noite pela SIC, será revelado um terceiro documento entregue ao governador pelos responsáveis do BPI – banco concorrente com o qual o BES esteve em processo de fusão –, onde se sustenta que o banco da família Espírito Santo, a braços com uma dívida de seis mil milhões de euros, estava falido desde 2011.