“Para mim, tem sido muito gratificante escrever crónicas. Foi um desafio que me lançaram e que eu tento manter ao longo deste tempo todo. Procuro manter sempre uma certa honestidade, mesmo sabendo que é difícil manter a novidade”, disse Dulce Maria Cardoso, esta tarde, 26, em declarações à VISÃO, após o anúncio da Associação Portuguesa de Escritores (APE), que acaba de atribuir à escritora e cronista da VISÃO um dos maiores galardões literários nacionais, o Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários.
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“O prémio também é importante na medida em que, perante a crise dos jornais e das revistas, importa salientar como este se trata de um espaço precioso que, felizmente, a VISÃO mantém”, acrescenta. E continua: “Uma sociedade sem escrutínio, sem jornalismo livre e independente, fica mais insegura em todos os sentidos. Porque os cidadãos informados são menos manipuláveis.”
O momento em que o prémio APE é tornado público também é feliz, na medida em que ocorre apenas um dia após a maior participação de sempre no desfile do 25 de Abril, na Avenida de Liberdade, em Lisboa. “Depois do dia de ontem, depois de ter estado na Avenida, estou cheia de esperança. Que as pessoas percebam a importância da democracia e do jornalismo livre e independente. Podem achar que sou tonta ao dizê-lo, mas eu acredito mesmo nisto: ‘O povo unido jamais será vencido.’”
Constituído por Carlos Albino Guerreiro, Helena Carvalhão Buescu e Salvato Teles de Menezes, o júri do prémio da APE justificou a decisão por se tratarem de crónicas “que prendem o leitor pela conjugação entre brevidade e intensidade do que é evocado e descrito”. Considerou ainda ser uma prosa “de altíssima qualidade, que transporta o leitor para o que é o verdadeiro valor das circunstâncias de que são feitos os dias.”
Para Dulce Maria Cardoso, as crónicas têm “uma natureza diferente” dos romances. “No caso de alguns leitores, as crónicas têm servido de entrada para os livros, que não são necessariamente a mesma coisa que as crónicas”, explica. Do ponto de vista da escrita, prossegue, não só a obrigam a fazer uma síntese como é ali que, pela primeira vez, “a cronista é personagem”.
O Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários é dado pela APE, em parceria com a Câmara Muncipal de Loulé, e tem um valor pecuniário de 15 mil euros. Em edições anteriores, já foi atribuído a Miguel Esteves Cardoso, José Eduardo Agualusa, Lídia Jorge, José Tolentino Mendonça, Pedro Mexia e Ricardo Araújo Pereira (este último também pelas crónicas da VISÃO, Boca do Inferno).
Entre os episódios da vida quotidiana, as memórias e as histórias com personagens ficcionais, são muitos os registos das crónicas de Dulce Maria Cardoso, que os leitores bem conhecem das páginas da VISÃO e que, entretanto, já chegaram ao formato de livro, pela mão da editora Tinta-da-China. O segundo volume de crónicas foi lançado pela editora em outubro do ano passado. Reúne 57 textos publicados nas nossas páginas entre maio de 2021 e julho de 2023.
A escritora iniciou-se no género da crónica em abril de 2019, a convite da VISÃO. Desde então, assina duas vezes por mês, revezando-se com José Eduardo Agualusa e Mia Couto. Poucos meses depois da sua estreia, em entrevista, a autora de livros como O Retorno e Eliete esclareceu que o nome das crónicas – Autobiografia Não Autorizada – está relacionado com o facto de lhe interessar “esse jogo entre a verdade e a mentira”. “Acho sempre que a melhor maneira de contar a verdade é inventar a melhor mentira que a sirva. Além disso, também gosto muito de brincar com os meus dados biográficos. Todos escrevemos a partir de nós próprios, das nossas vivências, mesmo que depois não as reproduzamos de forma literal”, disse então.