Esquecer, esquecer sempre, esquecer depressa. Até que nada de nada fique retidos nos filtros e nesses coadores da memória que dizem que existem. Relativamente fácil quando o que está em causa são filmes vulgares, que já vêm com a película gasta de tão trilhados pelos clichés do costume. O pior é quando à vulgaridade, mais ou menos inofensiva (se que este nome e adjectivo podem coexistir) se juntam alguma dose ofensiva. Aí retém-se alguns resíduos de irritação. Porque o oportunismo de Lembra-te de Mim é tão despudorado que ofende -apesar da “inofensividade” primária de tudo o resto.
É que tudo cheira a oportunismo barato neste filme. Primeiro, temos a exploração óbvia do actor mais cotado na bolsa dos valores das teenagers do momento – Robert Pattinson, que depois do Harry Potter e do vampiro na saga Crespúsculo, dá uns primeiros passos numa actuação de um estudante nova-iorquino cheio de traumas familiares, e então passa o filme a fazer esgares angustiados, como se qualquer um pudesse ser James Dean. Depois, para a geração mais velha, lá está também Pierce Brosnan no papel mais anódino de todos os tempos. Mas o pior de tudo é envolverem um drama familiar medíocre e uma história de amor anémica no tenebroso atentado das torres gémeas. Explorar a desgraça é legítimo no cinema, vale até esmigalhar as emoções do espectador, mas não em nome de um objecto afrontosamente interesseiro. Eu, se fosse mais americana do que sou ( toda a gente o é, não há como escapar-lhe…) ficava indignada. Assim fico só irritada.
Desta vez, não há nenhuma afro-americano XXL desgraçadinho, que tem habitado os filmes mais lamechas de Hollywood. Mas há uma cândida menina, a irmãzinha mais nova, que é vítima de bullying e a quem numa festa infantil cortam uma madeixa de cabelo. E a pobre menina, já infeliz porque o pai muito ocupado nos negócios não comparece à exposição de desenhos escolares, ainda tem de fazer um corte de cabelo radical, porque as malvadas das colegas acham que ela é uma menina diferente e andaram a brincar aos cabeleireiros. Claro está que isto deixa o protagonista da história muito perturbado, cheio de fúrias angústias. Não há direito! O cabelo da menina, o pai que não abandona as reuniões no escritório… E ainda um irmão mais velho que se suicidou porque queria ser músico e também devia ser muito infeliz.
Portanto, o rapaz, é revoltado. E tanto investe contra polícias e assaltantes, como, com a mesma impetuosidade, arrasa uma aula de meninas de onze anos apavoradas.
Ele não quer saber nada de “miúdas nem de copos”, como lhe anda sempre a sugerir o colega patetinha (existe sempre o contraponto do colega patetinha). Anda desorientado, fuma que se farta, não sabe o que quer fazer da vida, e diz uma patacoadas pretensiosas, pseudo-filosóficas que incluem mitos gregos e “balelas niilistas”. A certa altura, diz se não sabe se aqueles pensamentos não serão meras “tolices poéticas”. Quanto às tolices, perfeitamente de acordo.
O argumento parece todo ele construído como se fosse uma linha de metro. Temos a cena do jovem traumatizado. Que tem ligação directa com a relação conturbada pai/filho. Próxima estação: a cena do primeiro beijo com uma adolescente também com um trauma familiar mas com melhor feitio. Estação seguinte: a cena do sexo. A seguir lá vem a redenção familiar (sim, o pai até tinha as fotos dos filhos no desktop). E a estação terminal do grande Bum!
Para esquecer.
![legenda olhos](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/11/6213880legenda-olhos.jpeg)