Falar dos talentos cinematográficos de Madonna seria tão monótono e extenso como fazer um inventário de tudo o que escasseia num hospital da Serra Leoa. Faltam pensos rápidos para a paciência, desinfectante para o mau gosto, ligaduras para o lugar comum, etc, etc…
No que respeita ao marketing do título, Madonna exibe todo um know-how de programa eleitoral. Apenas cumpre 50% do prometido. E entre a sabedoria e a sujidade nem vale a pena referir qual a porção que mais abunda naquele que é o primeiro filme realizado pela cantora.
Não há nada de estranho no facto de Madonna decidir realizar um filme. Na verdade, há para aí umas três décadas que a cantora trabalha com a imagem.
Além disso é a cantora mais rica do mundo, pode muito bem permitir-se a uma incursão em território alheio. A questão é que se não fosse o seu nome na ficha técnica do filme, ele nunca estrearia numa sala de cinema. Não por ser chocantemente mau – há realizadores profissionais que produzem objectos muito mais embaraçosos do que este. Mas por ser um filme completamente irrelevante, que não teria interesse nem sequer no mais pindérico festival de terceira categoria.
Noutro escalão etário, este até podia ser considerado um filme promissor, embora um tanto imaturo, mesmo para os teenagers que tanto se dedicam a home-movies.
Da sabedoria de Madonna não se esperava grandes considerações filosóficas, mas no que toca a sujidade, regista-se o esforço escatológico. Sujidade & Sabedoria limitada.
O que Madonna tem para apresentar, neste sector, é um líder de uma banda punk cigana (Eugene Hutz faz de si próprio, líder dos Gogol Bordello) que ganha a vida a fazer serviços de macho ou fêmea (varia…) dominadores. Uma bailarina clássica que ganha a vida a fazer streap-tease agarrada ao varão. E uma filantropa (gostava era de ir para África vacinar crianças) que ganha a vida como farmacêutica. Tudo isto num ambiente londrino, completamente datado e déjà vu.
Alguém tem de avisar Madonna que se ela quer chocar, isso já não vai lá com chicotes, nem correntes, nem unhas pintadas de preto, nem danças no varão, nem cenas sado-masoquistas, nem donas de casa gordas vestidas de colegial…
Não se elevando num altar de bom gosto, o filme salva-se não tanto pelo sotaque ucraniano e pelo bigode de Eugene Hutz, que vai tecendo umas pretensiosas considerações sobre a vida. Mas por uma outra cena: Aquela em que a actriz que faz de bailarina mata uma barata com a sapatilha cor-de-rosa de ballet. Para metáfora não está nada mal. Para uma principiante também não…