Nada como um escândalo cor-de-rosa para desviar as atenções do novo Orçamento de Estado, documento aparentemente impraticável e desacreditado dentro do próprio Ministério das Finanças que o concebeu. A proposta surgiu acompanhada de forte incredulidade e contestação que, aliás, já não despertam surpresa. Porém, quando a onda de críticas afeta, inclusive, o partido que apoia o Governo, percebe-se a urgência em introduzir no país uma temática dissipadora de conversação, que vingue nas horas em que não há ninguém a fazer o amor na Casa dos Segredos. Em boa circunstância, por isso, estalou o verniz no matrimónio de Bárbara Guimarães e Manuel Maria Carrilho.
Não deixa de ser bizarro que duas figuras públicas, há doze anos a alimentarem a imagem de casal perfeito e feliz, tenham decidido, de um dia para o outro, trocar ofensas em plena praça pública. Ainda assim, há a destacar, de parte a parte, a brilhante demonstração de profissionalismo durante este processo. A começar por Bárbara que, arredada do pequeno ecrã há um ano, mostrou que mantém vivas as qualidades que todos lhe reconhecem. Como boa apresentadora que é, apresentou o divórcio no telejornal da SIC. De outra forma não faria sentido, aliás. A estrela de televisão fez acompanhar a notícia por uma queixa-crime, alegando que o ex-ministro, em vias de se tornar ex-marido, lhe andava a praticar a austeridade nas ventas. Quem sabe, ainda por imposição da troika.
A reação de Carrilho não se fez esperar e, como experiente político que é, rapidamente lhe diagnosticou um défice elevado, apelando à ajuda externa para lhe resolver os problemas de alcoolismo e comprimidos, que a faziam atuar como “pessoa enlouquecida”. Recuando há mais de trinta anos, o discurso assemelha-se àquele que usara para descrever a primeira mulher, Joana Varela, que então acusara de “louca varrida” e “pessoa delirante”. A ser verdade, em ambos os casos, Carrilho tem, diga-se, um gosto bem peculiar no que ao lado feminino diz respeito. Todavia, perfeitamente compreensível, por dois motivos. Em primeiro lugar, depois de um dia de trabalho, deve ser agradável, para um homem de filosofias e literaturas, chegar a casa e poder abstrair-se das suas teses, como acontecia, precisamente, com Bárbara: “Ufa, hoje escrevi mais cinco capítulos para o meu novo livro; e o teu dia como foi?” “Foi ótimo, querido, também já vou nas cinco garrafas de vodka!” Seria, portanto, este tipo de eloquências que o catedrático estaria à procura para não se falar de trabalho à mesa. A outra causa está, inevitavelmente, aliada à conjuntura política do século XXI, uma vez que a apresentadora assumiu papel central no vídeo que lançou a candidatura de Carrilho ao município de Lisboa, em 2005. E, de facto, tendo em conta o Orçamento de Estado proposto para 2014, não admira que sejam os alcoólicos a tratar das propagandas que metem o pessoal no Governo.
Como parte do trabalho de pesquisa que efetuei, e aqui leia-se a inexistência de quaisquer fins recreativos, confesso que também eu me encontro embriagado, a acabar a segunda garrafa de tinto e sob efeito de uma dezena de comprimidos, enquanto redijo esta crónica. Optei por não ingerir mais medicação, com medo de falecer. É evidente que sou um menino ao pé de Bárbara Guimarães neste tipo de matérias. Assim, vou optar por não me alongar mais no assunto, dado que já lá vão quinze minutos desde a última vez que senti as pernas.
Ricardo Marques
Rabanadas de Escrita
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