Na porta da nova padaria da Bica estão escritos os quatro ingredientes usados para fazer pão à moda da Bike Bakery: farinha, água, sal e tempo. Leu bem. “O pão mais rápido que faço, fermenta 24h. O nosso grande trabalho é tornar o glúten digerível e quanto mais tempo fermentar, melhor”, traduz André Alvim, o padeiro de 51 anos, que mete todos os dias a mão na massa. “Costumo dizer que fazemos pão de fermentação espontânea, que ganha sabor e digestibilidade consoante o tempo em que repousa.” Mais: André gosta se atirar ao que chama de “brincadeiras com o sabor do pão”, isto é, lançar-se em edições especiais, como o pão de azeitonas, o de tomate seco, queijo grana padano e orégãos, ou o de queijo da Ilha, com os ingredientes adicionados logo desde o início do processo. “Assim, [os ingredientes] passam 30 horas a fermentar, portanto, além dos produtos, a massa vai ganhando também mais sabor.”
Os três sócios, André Alvim, Lilia Fortuna e Helena Stewart são cariocas e cruzaram-se em Lisboa quase por acaso. André foi ator de teatro durante 30 anos, viajou o mundo e sempre se encantou pelo universo do pão. Estudou gastronomia na Academia Alain Ducasse, já com a mira apontada ao trabalho com o pão e há mais de dez anos que o faz, que o vende em feiras e numa bicicleta, e que ensina a fazê-lo em formações. “A Bike Bakery Lisboa é a continuação de um projeto que eu tinha no Rio, onde entregava pão de bicicleta.” Por enquanto tem apenas uma loja de rua, mas o sonho é repetir a ideia em Lisboa num futuro próximo. Lilia trabalha com cozinha desde os 17 anos, teve empresas de catering durante mais de 20 anos – “vou em março ao Rio, porque um antigo cliente meu vai fazer 80 anos e diz que não faz a festa se não for comigo”, confidencia – e mudou-se para Lisboa à procura de uma vida mais calma. Já Helena, trabalha no teatro, entre o Rio de Janeiro e Lisboa, e é a dona do prédio na Rua dos Cordoeiros, onde moram os três fundadores da casa e fica a padaria. Lilia detalha: “A Helena e o André são amigos há décadas, eu só os conheci quando vim morar nesta casa. Mas a Helena tinha o espaço disponível, o André queria abrir uma padaria cá e eu podia fazer a parte executiva. E aí triangulou e abrimos a Bike Bakery.” Roubando à interlocutora esta bela palavra em português do Brasil, triangulou muito bem.
André chegou a Portugal em março de 2020, na semana em que o país se fechou em casa e poucos dias depois tinha uma saca de farinha de trigo de Paulino Horta à porta para se entreter. Até abrir as portas da sua padaria, fez consultoria para alguns restaurantes, entre eles a pizzaria Jezzus, ganhou contactos e foi planeando este projeto. Em junho, quando a Bica se enfeitou para receber os Santos Populares, o trio, que ainda não tinha as obras feitas mas já contava com uns fornos caseiros, abriu um balcão para a rua e vendeu algumas sandes e pizzas. Testes para o que seria feito a partir de outubro, quando a padaria abriu as portas.
Vendem pão de trigo Barbela, pão de centeio, pão de trigo integral (os preços começam nos €3.20), pão de sementes e amêndoas, focaccia com fermentação de 36 horas, entre outros especiais; têm também aquilo a que chamam “as pequenezas de balcão”, o cinnamon roll, o pão de queijo (aquecido no forno ao momento), o brioche recheado com sabores diferentes, exemplo do pepperoni com queijo ou do queijo com cebola; e ainda sanduíches em focaccia, como a caprese, com tomate e mozzarella, rúcula e pesto, ou a mortadella com straciatella e pistáchio ou quem sabe uma de cachaço de porco com chutney de goiaba, queijo gouda e pickles de cebola roxa. “Tem um banquinho que fica ali fora, as pessoas também se sentam nas escadas da rua, temos café”, resume Lilia. “Temos crescido em vendas todas as semanas”, acrescenta André, também em referência aos restaurantes para os quais começa a fornecer pão. “Há dias em que faço 150 kg de pão.” E a expetativa é aumentá-lo.
Rua dos Cordoeiros, 14, Lisboa / ter-sáb 10h-18h