Paris foi uma festa nas décadas de 1920 e 1930, alimentada também pela revolução do cubismo, do dadaísmo e do surrealismo, movimentos influenciadores de outras disciplinas, incluindo a moda – que o diga Elsa Schiaparelli (1890-1973), capaz de fazer na moda o que Dalí fazia em obras oníricas.
Gabrielle Chanel (1883-1971) estava nos antípodas do que Schiaparelli fazia – e reza a petite histoire que eram rivais –, mas foi vanguardista ao criar uma nova silhueta inspirada na roupa masculina, livre dos espartilhos. Se se é um admirador dos conjuntos de tweed e fiadas de pérolas, e da mala acolchoada com alça de corrente, importa calibrar as expectativas ao entrar em Coco Chanel, Além da Moda: esta exposição não é uma incursão museológica oficial ao guarda-roupa criado por Gabrielle. É um convite para apreciar o espírito de uma época e de uma criadora, através dos artistas de quem foi musa, amiga, mecenas.
Existem alguns exemplares de vestuário e sapatos da marca Chanel – nenhum assinado por Gabrielle. Há fotografias, obras originais e esculturas, serigrafias e litografias, alinhadas para convocar o talento insurreto de Dalí, o cubismo de Picasso ou o contributo de imagens icónicas de Man Ray: Nancy Cunard com os braços cobertos de pulseiras; a modelo com vestido plissado de Vionnet reclinada numa carreta; Peggy Guggenheim vestida com um sublime Poiret; ou a própria Coco, de perfil, jaqueta negra cintada.
Há também obras de Tamara de Lempicka (um surpreendente óleo sobre flores), Oscar Domínguez, Josep Maria Sert, Apel.les Fenosa (escultor e amante de Chanel). E há as fotografias de François Kollar (1904-1979) captadas no famoso apartamento com o biombo de coromandel do Hotel Ritz, em Paris, onde Coco Chanel viveu de 1937 até à sua morte: os lugares e as poses da estilista, uma outra arte.
Arte versus moda
Coco Chanel admirava a arte, mas marcava a diferença entre disciplinas. “A moda não é uma arte, é um ofício. O facto de a arte se servir da moda é mais do que suficiente para a glorificar”, lê-se numa das muitas citações suas inscritas nas paredes. As fotografias a preto e branco dominam o espaço. Mas há bastantes exemplos de arte pictórica e alguma escultura, como Glória, de Appel.les Fenosa, as três águas-fortes de Dalí – que em 1921 desenhou o frasco de perfume Nº 5, evocado na grande litografia pop de Andy Warhol – ou as serigrafias e os pochoirs de Picasso, como Rapariga Sentada (1955) vista na exposição.
Coco Chanel, Além da Moda > Centro Cultural de Cascais > Av. Rei Humberto II de Itália, Cascais > T. 21 481 5660 > até 3 nov, ter-dom 10h-18h > €5