Não se deixem enganar pelo título do artigo, o filme nada tem que ver com a trilogia animada da DreamWorks, de Alex e seus companheiros. Isto apesar de usar a animação enquanto recurso estilístico em várias fases do filme. O Madagáscar que aqui existe não é feito de leões, zebras e outros animais da savana, mas sim de uma fauna humana, espécies invasoras que põem em causa as autóctones, tudo aos olhos de uma criança, que observa e efabula.
Em determinados momentos, não fosse o cenário de Madagáscar em vez da Bretanha, confundir-se-iam cenas e o espírito de O Verão do Skylab (2012), filme em que Julie Delpy tão bem retratou a disfuncionalidade das famílias felizes. Essa agitação, ideia de paraíso na Terra, quase nos intimida no início acelerado. Aos poucos, a euforia vai-se apaziguando e vamos tirando camadas e descobrido a podridão de um contexto que pouco tem de idílico.
A Ilha Vermelha situa-se no Madagáscar do início da década de 1970, em pleno pós-colonialismo ou neocolonialismo francês. A ilha ganhou independência nos anos 80, mas os franceses, com o pretexto de manterem a paz e a segurança, permaneceram por lá, com destacamentos militares, perpetuando estratificações sociais obsoletas.
O tema é raro no cinema francês. Mas Robin Campillo aborda-o com particular elegância. O racismo e o chauvinismo estão lá, observando-se sobretudo em detalhes. Aliás, o filme tem essa habilidade de ir tornando cada vez mais visíveis esses elementos, ao mesmo tempo que cria uma aura de nostalgia de época e de um passado colonial.
O olhar da criança, explorado de forma não linear, permite aquilo que se pretende. Não um juízo marcado, mas um ponto de vista algo neutro, observacional, misturado com um riquíssimo universo fictício. Tal como no filme da DreamWorks, Madagáscar continua a ser uma ilha imaginada.
A Ilha Vermelha > De Robin Campillo, com Nadia Tereszkiewicz, Quim Gutiérrez, Charlie Vauselle, Amely Rakotoarimalala > 117 min