Há um subgénero cinematográfico muito popular na América do Sul, que se poderá denominar thriller de favela. Aborda a realidade desses bairros das grandes cidades, sobretudo do Rio de Janeiro, de forma radicalmente diferente dos clássicos de Nelson Pereira dos Santos. O filme fundador deste subgénero terá sido a Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles. Aquele que o cimentou, Tropa de Elite (2007), de José Padilha.
Leonel Vieira, realizador e produtor de blockbusters à portuguesa, aventurou-se num exercício de género neste O Último Animal. E deve dizer-se que o fez com grande competência – é um filme empolgante, com um argumento bem escrito, cheio de pormenores que seguram a linha narrativa. Há alguns excessos formais, uma certa gratuitidade na colocação da câmara, ralentis forçados, banda sonora pobre, clichés variados. Mas, em geral, é uma obra muito bem conseguida, provavelmente o melhor filme de Leonel Vieira desde Zona J (1998).
O Último Animal é um filme brasileiro, no seu contexto, estilo e voz. Isto, apesar da participação de Joaquim de Almeida como “padrinho” da máfia local. No entanto, Leonel Vieira preparou bem a migração. Não de forma realista, e não será essa a intenção, mas percebendo as potencialidades do ambiente para a construção de um emocionante filme de género. Não obstante, há pistas para uma âncora na realidade, tocando questões fraturantes a partir do mundo das favelas, como a discriminação racial e de género, a dificuldade de ascensão social, a pobreza, a violência e até a gentrificação.
O filme usa o jogo do bicho como linha condutora. Aliás, o jogo do bicho é a grande arma narrativa, mostrando o modo como os “bicheiros” acabaram por dominar o negócio do tráfico de droga no Rio. Esse padrão é um elemento que dá força ao argumento, do início ao fim. Uma história animalesca, feita de ruas estreitas e labirínticas, mas sobretudo de becos sem saída.
O Último Animal > De Leonel Vieira, com Joaquim de Almeida, Duran Fulton Brown e Alejandra Toussaint > 109 min