Gaspar Noé é um cineasta de choque. Os seus filmes são perturbadores e buscam alarido, tanto como os de Lars von Trier e mais do que os de Michael Haneke, mas de forma mais minimal, concentrada, imagética e descurada em termos de argumento. Se em Love tudo girava à volta do sexo, sem pudor em roçar a pornografia, Clímax como que completa a trilogia clássica, oferecendo-nos, em doses massivas, droga e rock’n’roll (e quem diz rock, diz também hip-hop, trance ou rhythm and blues).
A história, com um fundo verídico, acompanha uma residência criativa de três dias de um grupo de bailarinos, promovida por uma conceituada coreógrafa. A primeira parte do filme é feita de deslumbrantes momentos de dança, interpretações individuais e coletivas de encher o olho, captadas por uma câmara também ela dinâmica, como se invejasse os movimentos dos bailarinos. A estética impõe-se sobre a narrativa, como noutros filmes de Noé. Até que começa a festa. Os bailarinos, soltos, querem divertir-se. Comem e bebem. Porém, alguém pôs LSD na sangria e tudo se torna trágico e alucinante.
A segunda parte do filme é feita de violentas trips descontroladas, de drástica loucura. As personagens deambulam, perdidas, abrem espaço para as suas fobias e paranoias, resolvem irracionalmente os medos; em vez de paraísos florescentes, paisagens idílicas e coloridas como os riffs de guitarra de Jimmi Hendrix, tudo se converte num sinistro pesadelo com consequências reais. A câmara de Gaspar Noé também bebe um pouco de sangria e acompanha as personagens com a mesma liberdade de movimentos, num olhar decrépito sobre a natureza humana sem freios. Noé filmou Clímax sem guião e em tempo recorde. Segundo se diz, teve a ideia para o filme em dezembro e estreou-o em Cannes três meses depois. Uma alucinante experiência emotiva e sensorial.
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Clímax > De Gaspar Noé, com Sofia Boutella, Romain Guillermic, Souheila Yacoub > 95 minutos