No tempo das selfies, não podia ser mais oportuna esta exposição que apresenta obras de uma centena de artistas, de Gregório Lopes a Vhils. Um desafio ao espectador. De que falamos quando falamos de retrato? Talvez este género artístico, um dos mais nobres e praticados na História da Arte, seja hoje dos mais desvalorizados. Retratos vemos por todo o lado, a toda a hora. Mas o que têm eles de artístico? E até onde podem ir (ou já foram) os limites da criação? Eis algumas inquietações que Do Tirar Polo Natural deixa no visitante. O título remete para o famoso tratado de Francisco de Holanda, teórico português do século XVI que conheceu Miguel Ângelo e o melhor da arte italiana. Frases do seu livro servem de fio condutor à exposição, sublinhando sintonias (o retrato sempre teve as suas regras) e dissonâncias.
Sem se definir como uma antologia (não é o melhor de…) e recusando a ordenação cronológica, Do Tirar Polo Natural divide-se em três núcleos: “Do Afetivo”, porque o retrato começou por ser a memória de uma ausência; “Da Identidade”, porque o retrato (e o autorretrato) assume-se como espelho, real ou imaginário, e “Do Poder”, porque o retrato foi usado com fins sociais, políticos e religiosos.
A disposição da exposição remete, sobretudo no início, para os gabinetes de curiosidades, com peças (pintura, escultura, fotografia, desenho, vídeo e instalação) em cima umas das outras. É um risco que não raras vezes produz resultados felizes, como o diálogo entre Carlos Relvas e Fernando Lemos. A ousadia das soluções encontradas pelos comissários Anísio Franco, Filipa Oliveira e Paulo Pires do Vale pode ver-se sintetizada na inclusão de uma instalação sonora. Nada se vê, nada se define. Apenas uma voz que tenta identificar alguém num álbum de fotografia. “Não é este”, repete essa voz. De que falamos quando falamos de retrato?
Do Tirar Polo Natural > Museu Nacional de Arte Antiga, Rua das Janelas Verdes, Lisboa > T. 21 391 2800 > Até 30 set,
ter-dom 10h-18h > €6