As indicações são claras. O texto de Beckett Happy Days, que em português tanto se encontra traduzido para Dias Felizes como para Lindos Dias! (e nesta encenação de Sandra Faleiro é este último o título usado, uma opção do pianista e tradutor João Paulo Esteves da Silva), explicita que no centro do palco deve estar colocada uma colina e, enterrada até à cintura, está a nossa personagem principal, Winnie. Ela encontra-se a dormir. À sua direita deve ter uma sacola preta grande e à sua esquerda uma sombrinha. A luz deve ser ofuscante. O despertador toca e Winnie dá início ao seu dia. Espreguiça-se e começa por dizer: “Mais um lindo dia!”, com um sorriso de quem insiste em acreditar que as ações que vai repetir, iguais às do dia anterior e às do dia anterior ao anterior, terão um novo significado qualquer, como se da repetição se pudesse extrair novos sentidos. E pode. Resta saber quais.
Com Cucha Carvalheiro a interpretar Winnie e com Luís Madureira a fazer de Willie – o companheiro de Winnie que vemos apenas de costas e que lhe dá respostas monossilábicas –, esta nova encenação de Lindos Dias! revela a particularidade de ter uma imagem que, para se projetar no fundo do palco, passa por cima dos adereços e das personagens: a representação de um teatro em ruínas. Esta é uma tragicomédia que vive da ilusão de uma esperança que subsiste por vezes na desesperança. Uma peça já clássica do irlandês Samuel Beckett (1906-1989), a traçar uma linha que se situa entre o sentido e o não-sentido, entre o absurdo e o não-absurdo, que nos obriga a questionar o papel do tempo e do seu efeito na mecanização das nossas ações, da nossa vida. Ou que, simplesmente, mais não faz do que lembrar-nos de que um sentido para a vida pode mesmo não existir.
Lindos Dias! > São Luiz Teatro Municipal > R. António Maria Cardoso, 38, Lisboa > T. 21 325 7640 > 12-22 abr, qua-sáb 21h, dom 17h30 > €5 a €12